LIDE COM ESSA - O peso do comportamento de executivos na reputação organizacional. Por Ana Luísa Amore.

Nos últimos dias, as notícias da Covid-19 estão dividindo espaço com as informações sobre os acontecimentos políticos do Brasil, em especial com as notícias sobre a operação contra fake news que teve como alvo empresários e blogueiros que apoiam o presidente Jair Bolsonaro. Não precisa ser um profissional de comunicação para escutar algumas falas como ‘Você viu o que aconteceu com o dono da Smart Fit?’ ou ‘Agora, a Smart Fit é cancelada’. Talvez, para entender a origem e a motivação dessas falas é preciso conhecer um pouquinho mais sobre o que, de fato, estamos falando: reputação.

Edgar Gomes, dono da maior rede de academias da América Latina, fundador da Bio Ritmo e Smart Fit, foi um dos alvos da operação da Polícia Federal contra fake news. Ele é apontado como um dos principais financiadores e articuladores dos robôs que apoiam Bolsonaro nas redes sociais. O resultado das investigações ainda não saiu, mas o resultado desse fato nas redes sociais e no comportamento dos alunos das academias já está escancarado.

Além das inúmeras menções nas redes sociais, foi criada uma campanha na internet pedindo para que alunos façam o cancelamento de matrículas das redes SmartFit.

‘Mas, Ana…A Smart Fit não está sendo investigada, estamos falando de uma investigação de Pessoa Física. Por que, então, está acontecendo um boicote à rede de academia?’

Para Glória Origgi, filósofa italiana, a era da informação está passando e estamos entrando na era da reputação. Compartilho dessa visão. O suposto envolvimento do dono da Smart Fit e a onda de cancelamentos de matrículas e de mensagens negativas nos coloca diante da clássica relação causa/consequência, em que um evento é resultado de outro. No contexto da comunicação institucional, essa relação se dá, mais ou menos, da seguinte forma: as ações dos funcionários, principalmente dos executivos, possui um peso grande na imagem da empresa perante a sociedade. Quando um deles faz alguma coisa condenável ou que desagrada a maioria da população, o resultado é sentido na opinião das pessoas sobre aquela marca e no comportamento de compra ou uso do serviço.

A literatura traz diversos conceitos de reputação no contexto das organizações, mas destaco três correntes que se encaixam bem no cenário atual, em que a internet aproximou e conectou pessoas à empresas. Uma delas é baseada no conceito de expectativas sociais, as expectativas que as pessoas têm em relação ao comportamento das organizações. A segunda aborda o conceito de personalidade corporativa ou organizacional, ou seja, nos traços de personalidade que as pessoas atribuem a uma organização. E a última está centrada no conceito de confiança, na perceção sobre a honestidade, a confiabilidade e a benevolência de uma organização.

O consumidor atual é mais racional e consciente com os valores que possui e que busca encontrar nas empresas em que consome. Hoje, as  organizações precisam ter um posicionamento e falar sobre esse posicionamento. Em tempos de redes sociais, não basta ter, é preciso mostrar que tem e fomentar iniciativas que contribuem com a sua visão. Prova disso, é a avaliação positiva da rede Magazine Luiza durante a pandemia – em pesquisa realizada pela ESPM Rio, a Magalu aparece como a marca mais bem avaliada durante a crise, graças ao posicionamento claro e às ações condizentes com os valores pregados pela empresa.

A reputação de uma empresa está intimamente ligada com a percepção das ações passadas e das perspetivas futuras e a construção e gestão de uma boa imagem reputacional depende dos relacionamentos que a empresa mantém com os seus stakeholders. Não é tarefa fácil gerir a reputação organizacional, não tem receita de bolo, mas há um consenso entre os profissionais da área: política, futebol e religião são assuntos sensíveis que se não forem bem trabalhados, é melhor nem começá-los.

O cuidado com o que fazemos em um mundo completamente digital deve ser ainda maior, afinal há lastros, há prints, há históricos, há fotos, gravações e diversas formas de provar uma opinião infeliz, um comentário desnecessário e até mesmo o envolvimento com ações criminosas.

Até dezembro de 2019, a rede SmartFit contava com 2,5 milhões de alunos e 730 unidades espalhadas por dez países. Diante dos últimos acontecimentos envolvendo o dono da rede, certamente esses números irão diminuir – e não é apenas por culpa da pandemia, mas pela crise de reputação provocada.

Ana Luísa Amore é jornalista e consultora de comunicação, pós-graduada em Gestão Estratégica da Comunicação e com MBA em Gestão de Negócios. Mais de 10 anos de experiência em comunicação institucional, principalmente em comunicação interna e gestão da mudança, branding e assessoria de imprensa.