Estamos realmente conectados? Por Sol Oliveira.

Quero começar este artigo analisando o significado de “conectado”. Algumas definições que encontramos:

Diz-se daquilo que se conectou ou ligou; que foi unido; que está relacionado.

Algo ligado, por exemplo, a redes elétricas ou pessoas conectadas via computador etc.

Que estabeleceu conexão entre duas ou mais coisas: ligado, unido, junto, interligado, acoplado, preso, prendido, fixo, fixado, atado, amarrado, liado, agregado, vinculado, ajuntado.

Que está online.

Que está atento, “antenado”.

Estes exemplos trazem fortemente o conceito de ligação com algo ou alguma coisa e implicitamente carregam o viés de tecnologia.

É interessante observar que antes da chamada revolução digital e do avanço das tecnologias de informação, o termo “conectado” não era associado à comunicação propriamente. Na verdade ele começou a ser utilizado como hoje a partir do desenvolvimento da internet, com o surgimento das primeiras “conexões” em rede nos anos 1960. Antes disso, o termo servia para designar a forma de funcionamento das máquinas, nos anos 1950, equipamentos conectados à energia elétrica e, mais tarde, computadores conectados à rede.

Marshall McLuhan já previa no início dos anos 1960 que o mundo se tornaria uma grande comunidade global, onde conexões simultâneas permitiriam a comunicação com todos os cantos do mundo, ultrapassando as barreiras físicas que antes limitavam a interação dos indivíduos.

É redundante afirmar que essa transformação tecnológica revolucionou a forma como as pessoas se relacionam e determinou novos padrões de conhecimento, de trabalho, de comportamento e de interações humanas.

As redes sociais trabalham fortemente este conceito de conexão. Elas são, sem sombra de dúvida, as principais ferramentas do mundo conectado. As redes sociais ampliaram a usabilidade da internet. Evoluímos da capacidade de “acessar qualquer informação” para “interagir com qualquer informação”, em qualquer lugar, sem qualquer limitação de tempo ou espaço. Em resumo, podemos não somente acessar um conteúdo, mas também interagir ativamente com ele.

Isso significa estar conectado a tudo.

Voltemos à provocação inicial do artigo e, mais precisamente, à uma das definições da palavra, colocada logo no início: que foi unido, que está relacionado.

“Estar unido” a alguma coisa e “estar conectado” são expressões que têm o mesmo sentido de acordo com as definições apresentadas… mas será mesmo?

O advento da pandemia de Covid-19 trouxe um cenário caótico para a população mundial, cenário este que foi amenizado pelas redes sociais – as pessoas conseguiram ultrapassar as barreiras do isolamento com as lives, videoconferências, conteúdos de streaming e por aí vai. Mesmo isolados em suas casas, os indivíduos se mantiveram conectados através das redes sociais e da internet. A pandemia arrefeceu, mas os novos modelos de trabalho e de comunicação que ela originou permaneceram, ou seja, a conexão entre as pessoas conforme a definição que já mencionamos continuou e se fortaleceu ainda mais.

No entanto, várias pesquisas pós-pandemia sinalizaram um aumento considerável da depressão e da sensação de solidão por boa parte da população. A saúde mental, que já era um tema de atenção entre os governos do mundo, passou a ter uma importância muito maior diante da evidente necessidade de criação de políticas e ações de saúde para minimizar os efeitos psicológicos causados pela pandemia. Especialmente entre os mais jovens, considerados os mais conectados, que são mais solitários ou propensos à depressão advinda da sensação de solidão ou de não pertencimento.

Então, voltamos à questão inicial: estamos verdadeiramente conectados?

Arrisco em responder que não. Se o conceito que estamos usando for além ao de estar ligado, atrevo-me a afirmar que as pessoas se conectam mais, porém se relacionam menos.

Consigo me conectar com qualquer pessoa no mundo, mas a proximidade, convivência, comunicação e atitudes que caracterizam um “relacionar-se” não se sustentam apenas com tal conexão. Talvez isso explique um pouco a sensação de não pertencimento, ainda que estejamos conectados a outros indivíduos, comunidades na rede etc.

O objetivo deste artigo é trazer uma reflexão sobre a qualidade daquilo que hoje chamamos de conexão e os fatores presentes nessa conexão versus relacionamento. No mundo do trabalho, muito se fala em colaboradores conectados à cultura da empresa, mas será que estamos avaliando o quão conectado o profissional está ou o quanto ele se relaciona de fato com os aspectos culturais da empresa?

Conexão e relacionamento não são a mesma coisa ao meu ver e talvez este seja um dos desafios da nossa era; construir relacionamentos a partir de conexões para que as pessoas de fato se sintam parte – e isto se aplica a todas as esferas da vida, seja trabalho, família, círculo social, política e assim por diante.

Penso que a letra da canção “Terra de Gigantes”, de Humberto Gessinger, escrita em 1987, traduza bem esse tempo presente:

Mas agora, lá fora
Todo mundo é uma ilha
A milhas e milhas e milhas
De qualquer lugar

Sol Oliveira é relações-públicas com especialização em Marketing. Gestora de Comunicação Corporativa e Marketing em empresas de segmentos diversos, professora universitária e palestrante em temas ligados a Branding, Cultura Corporativa, Mídias Sociais e Identidade Corporativa | Sololi0402@gmail.com