Será que o cliente sempre tem razão? Por Naomi Tatekawa.

Tenho certeza de que todo mundo já escutou, pensou ou até mesmo tentou se beneficiar da conhecida ideia de que ‘o cliente tem sempre razão’, mas será que essa máxima impregnada em nosso DNA realmente deve ser seguida a ferro e fogo?

Acompanho um perfil em uma conhecida rede social; trata-se de uma página de um aplicativo de mobilidade urbana que narra alguns casos vividos por seus motoristas e clientes – devo confessar que sempre dou muita risada, e me questiono até onde as pessoas realmente acreditam que ‘o cliente tem sempre razão’, pois fica claro que muitas vezes esta ideia está enraizada no subconsciente das pessoas.

Tomei a liberdade de compartilhar alguns casos para que vejam algumas exemplificações de como clientes – mesmo errados – acreditam ter sempre razão, e que tudo é permissível uma vez que estão pagando por um serviço (vale neste caso me apropriar do uso de um famoso bordão brasileiro: ‘to pagaaandooo!’).

Os casos abaixo demonstram que muitos acreditam que não é necessário seguir regras de trânsito (nesse caso) ou até mesmo de boa educação, somente pelo fato de que o cliente está pagando pelo serviço, e está garantido pela ideia de que sempre tem razão.

‘Bom dia, dá para levar 4 adultos e 5 crianças, né?’;

‘Moço, está dando R$ 44,00, mas eu pago R$ 20,00’;

‘São 6 crianças e 3 adultos’;

‘Você está sendo pago para me levar para os lugares e não para receber boa tarde ou não’;

‘Estou atrasado e se você não vier rápido irá refletir na sua avaliação’.

Mas… claro que isto não acontece somente em aplicativos de transporte urbano. Em todas as situações que envolvem ‘clientes’ podemos encontrar situações como estas. Essa ideia de que o cliente sempre tem razão nasceu no começo dos anos 1900, sendo assim já faz mais de 100 anos que o famoso empresário britânico Harry Gordon Selfridge disseminou esta ideia globalmente e fez com que todos que estão pagando por algo, acreditassem que sempre estão cobertos pelo manto da razão.

Para aqueles que possuem clientes torna-se uma tarefa árdua manter uma relação saudável com seus clientes, garantindo a sua felicidade e satisfação, mesmo naqueles casos em que claramente o cliente nem sempre tem razão. As áreas de Customer Success enfrentam um grande dilema entre satisfazer a todo custo os clientes (garantindo o pensamento de que o consumidor pode tudo e que a marca nunca deve discordar dele) e barrar casos de puro abuso e demonstração, a todo custo, de um poder supremo e incontestável.

Embarcar nesse dilema de que o cliente sempre tem razão inquestionavelmente pode resultar em inúmeras consequências negativas para uma empresa, desde a perda de sua identidade, autoridade em um assunto que domina, ao enfraquecimento de sua cultura. Mas… será possível manter uma relação saudável e gerar satisfação ao cliente mesmo não concordando com ele sempre? Sim, é possível, mas para isto é preciso manter regras, posições e posturas claras sobre seu posicionamento.

Para garantir uma boa relação, mesmo nos casos em que é necessário contrariar um cliente, é preciso ganhar a confiança dele. Demonstre os seus conhecimentos e mostre segurança em seu posicionamento. Se necessário use dados de pesquisa ou utilize até mesmo outros casos parecidos para deixar claro de como tudo foi resolvido. É extremamente importante manter, a todo momento, o respeito frente ao cliente. Demonstre, por meio de caminhos claros e educados, que o pensamento dele não está completamente certo. Mostre soluções simples para o seu cliente, evidenciando assim que suas exigências não estão certas, pois muitas vezes o cliente se esconde atrás de ‘ter sempre razão’ pelo simples fato de que nem ele sabe exatamente a solução para os seus problemas. Demonstrar preocupação passa a sensação de que se está fazendo de tudo para ajudá-lo, e isto gerará um certo conforto para ele.

E, no final das contas, será que o cliente tem sempre razão? Não, discordar desta ideia nem de perto quer dizer que uma empresa quer criar conflitos com seus clientes, ou mesmo desprestigiá-lo ou ignorá-lo mas, sim, que ela se preocupa com o tipo de relacionamento quer manter com seus consumidores, priorizando um relacionamento honesto, saudável e duradouro para ambos os lados.

Imagem: pexels-ketut-subiyanto-4560152.

Naomi Tatekawa, graduada em Relações Internacionais, especialista em Inteligência de Mercado, com experiência de 10 anos nos maiores e mais renomados institutos de Pesquisa de Mercado do mundo. Durante estes 10 anos foi responsável pelo gerenciamento de alguns projetos importantes do mercado no segmento de Consumer Experience.