NOVA COLUNISTA: Juliana Tauil - Emoção é informação: por que a comunicação deve se importar com a fluência de processamento.

Competir pela atenção do público-alvo num mundo cheio de estímulos é como tentar ser ouvido por um colega a metros de distância no meio de uma tempestade – improvável e difícil, mas não impossível. Nessa tentativa, alguns fenômenos cognitivos são cruciais – e podem determinar o sucesso ou o fracasso de uma campanha de comunicação. Dentre eles, está a fluência de processamento. Como um componente relevante da cognição e da formação de percepções, ela explica por que algumas campanhas são mais eficazes que outras – e sua geração está diretamente relacionada a emoções e a experiências positivas com marcas e empresas. Aqui está o porquê.

O que é a fluência de processamento

Toda vez que o cérebro processa algum estímulo ou experiência, ele consome uma determinada carga de recursos e opera com certa velocidade. A facilidade com que esse fenômeno ocorre é conhecida como fluência de processamento, e essa experiência subjetiva tem consequências relevantes nos julgamentos e nas escolhas feitas pelas pessoas.

Primeiramente, a fluência é marcada hedonisticamente e experienciada como positiva. Segundo a teoria do afeto-como-informação, da psicologia cognitiva, as pessoas utilizam essa informação emocional para fazer julgamentos a respeito dos estímulos – e usam não só as informações racionais, mas também as emoções despertadas por eles na sua tomada de decisão.

Isso significa que toda vez que um indivíduo encontra um estímulo e seu cérebro o processa de forma rápida, fácil e fluente, surgem emoções positivas, aparecem as sensações de familiaridade, qualidade e segurança, e ele passa a gostar do estímulo – mesmo que inconscientemente.

O contrário também é verdadeiro: quando o processamento de uma informação é disfluente, emoções negativas são despertadas e, com elas, as sensações de insegurança, medo, desconforto ou estranhamento.

Em segundo lugar, as emoções e julgamentos inconscientes são preditivos importantes do comportamento – o que torna a fluência um fator de peso (*). Como se engajar em uma determinada ação – como comprar algo, por exemplo – exige esforço, a probabilidade de sucesso de um estímulo – como uma campanha de comunicação – é maior quanto maior for a facilidade percebida pelo indivíduo.

Implicações da fluência de processamento para a comunicação

Considerando que a facilidade de processamento é marcada positivamente, ela se torna um ponto de partida importante para criar experiências positivas na comunicação. Por essa razão, qualquer estratégia – em especial, as que visam incentivar um comportamento ou mudar uma percepção – deve também ser avaliada em termos de quão fácil de processar ela é.

De maneira geral, quanto menos energia mental for utilizada para processar uma informação, entender uma mensagem ou utilizar uma interface, melhor é a fluência e mais eficaz é a ação – especialmente se houver objetivos como a interação do indivíduo com a interface, a assimilação de uma mensagem ou maior familiaridade com uma marca.

Para tanto, profissionais de marketing, publicidade e comunicação organizacional devem se atentar à complexidade das suas campanhas e também a quanta energia cognitiva vão exigir de seu público-alvo durante suas ações.

Como gerar fluência

Há vários aspectos linguísticos, sensoriais, perceptivos e contextuais relevantes no processamento cognitivo. Para torná-lo mais fluente, algumas medidas são comprovadamente eficazes.

Em termos de atributos linguísticos, mensagens claras, simples, rimadas ou que já têm relações com estruturas adquiridas de conhecimento semântico ou de memória são mais fáceis de processar. Quando congruentes com atributos presentes no contexto, como elementos visuais e sonoros, também são mais fluentes.

Em termos visuais, clareza (inclusive na tipografia), alto contraste, simplicidade, prototipicidade e congruidade são formas de eliciar fluência. Inclusive, já que a aparência tem um papel importante no processamento de informações e na formação de julgamentos, ela é essencial especialmente em ambientes virtuais.

Outros atributos, como a capacidade cognitiva, o sistema sensorial do indivíduo e suas experiências prévias com o estímulo também podem contribuir para a fluência de processamento.

Além disso, é importante lembrar: o impacto de um determinado estímulo não depende só da sua própria fluência, mas também da fluência de outros estímulos no conjunto. Por isso, seus efeitos são sensíveis a variações.

Mas, atenção: algumas pesquisas sugerem que materiais projetados para motivar consumidores a se engajar em uma atividade são mais efetivos quando fáceis de processar, exceto se o empenho de esforços é parte dos objetivos do consumidor. Por outro lado, materiais projetados para motivar a compra de um serviço são mais efetivos quando difíceis de processar e, assim, sugerem que a tarefa é exigente demais e deve ser deixada para um profissional. Por essas razões, atentar-se para o papel do contexto na comunicação é fundamental – o que o indivíduo interpreta da sua própria experiência metacognitiva depende diretamente dele.

Como medir a fluência de processamento

Há muitas formas de medir a fluência de processamento – tanto objetiva quanto subjetivamente. As pesquisas mais recentes utilizam o tempo de resposta e o eye-tracking, por exemplo, para capturar a facilidade com que estímulos são processados em websites, peças de propaganda, textos, dentre outros materiais. Entretanto, alguns pesquisadores apontam que, por gerar uma experiência subjetiva e ser influenciada por aspectos individuais, a fluência é melhor capturada por medidas qualitativas, como os auto-relatos.

De forma prática, perguntas como “quão fácil foi ler este texto?” ou “quão difícil foi entender esta mensagem?” são boas opções para entender o nível de fluência gerado pela sua comunicação.

Para lembrar

  • A fluência de processamento é um fenômeno subjetivo e diz respeito à facilidade com que um estímulo é processado. Quanto maior a fluência, maior a geração de percepções positivas acerca do estímulo.
  • Quando eliciada, a fluência gera a sensação de familiaridade, qualidade e segurança – e torna o indivíduo mais propenso a gostar do estímulo com o qual teve contato.
  • Para gerar facilidade de processamento, é importante tornar a mensagem clara, simples, reconhecível e fácil de ser interpretada, bem como congruente com o contexto em que se encontra.
  • Especialmente num mundo em que a comunicação é mais acelerada e a quantidade de estímulos é massiva, torná-la mais fácil de processar é um recurso relevante para quem quer ser entendido e lembrado.

(*) Alguns pesquisadores afirmam que, apesar da fluência ter consequências positivas na maioria dos casos, não é possível afirmar que ela sempre trará os mesmos resultados em todos os indivíduos – isso porque o que o que uma pessoa conclui a partir das suas emoções, mesmo que inconscientes, também é uma função do contexto em que se encontra e do que ela pensa a respeito do próprio processo emocional. Para discussão, ver Schwarz, 2021.

Juliana Tauil é especialista em gestão de comunicação e economia comportamental. Como head de consultoria na The Choice Lab, aplica insights da área para melhorar as estratégias de comunicação e marketing das empresas.
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Imagem: Unsplash.

Referências

Im, H., Lennon, S. J. e Stoel, L. The perceptual fluency effect on pleasurable online shopping experience. Journal of Research in Interactive Marketing, v. 4, n. 4, 2010. pp. 280-295.

Schwarz, N., Jalbert, M., Noah, T. e Zhang, L. Metacognitive experiences as information: processing fluency in consumer judgement and decision making. Consumer Psychology Review, 2021. (Ainda em processo de publicação.)

Kostyk, A., Leonhardt, J.M. e Niculescu, M. Processing fluency scale development for consumer research. International Journal of Market Research, 2019.

Sohn, S. Consumer processing of mobile online stores: sources and effects of processing fluency. Journal of Retailing and Consumer Services, v. 36, 2017. pp. 137-147.

Kahneman, D. Rápido e devagar: duas formas de pensar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

Graves, P. Por dentro da mente do consumidor: o mito das pesquisas de mercado, a verdade sobre os consumidores e a psicologia do consumo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.

Yablonski, J. Leis da psicologia aplicadas a UX: usando psicologia para projetar produtos e serviços melhores. São Paulo: Novatec, 2020.