NOVO COLUNISTA: Luis Erlanger - O vírus da desinformação.

Infodemia: assim a Organização Mundial da Saúde (OMS) rotulou, logo após o surgimento do surto de Covid-19, a superabundância de informações sobre a nova doença, muitas imprecisas, criando, com velocidade, um ambiente de insegurança, incerteza e até discórdia, pessoalmente e on-line. Uma enfermidade midiática inédita na História da Humanidade. E que também parece longe de se extinguir.

Um tsunami infinitamente mais avassalador do que as pandemias virais do passado recente, por ser amplificado, alucinadamente, pelas mídias sociais. A ignorância histérica, por sua vez, abriu caminho no terreno fértil do pântano das fake news. Comandada pela canalhice humana, um movimento criminoso de espalhar informações sabidamente mentirosas, para atender seus interesses políticos e econômicos – que, normalmente, sapateiam sobre o interesse público, de mãos dadas.

Impossível não registrar – longe de partilhar das mesmas intenções de governantes críticos mas por razões escusas – que a própria OMS, no começo, contribuiu com o clima de dúvidas, ao demorar em tomadas de posição e mudar avaliações e recomendações.

Assim como respeitadas autoridades médicas que, de saída, subestimaram o potencial de propagação e letalidade de um novo vírus.

Todo vacilo, ainda que involuntário, foi transformado (in)devidamente em munição para o jogo sujo.

Mesmo no campo da verdade, não há segurança alguma sobre o futuro próximo. O que vale dizer, que, mais de seis meses depois de quando se acredita que tenha acontecido o primeiro caso, não temos certezas sobre a situação.

O jornal ‘O Globo’, repetindo o que fez o ‘The New York Times’, reuniu doze profissionais de saúde que enfrentam diariamente a pandemia da Covid-19. Epidemiologistas, médicos intensivistas, infectologistas e pneumologistas, responderam quando se sentiriam seguros para retomar atividades costumeiras na vida das pessoas. Não houve nada perto da unanimidade entre as 25 situações apresentadas.

Mas, como diz o historiador Yuval Harari, o maior perigo não é o vírus, mas ódio, ganância e ignorância.

Ele observa que a realidade mundial é resultado da ação de políticos irresponsáveis que minaram, deliberadamente, a confiança na ciência, nas autoridades públicas, na mídia e apostaram no isolacionismo. O que precisamos hoje é justamente da ciência, de gestores públicos, da crença nos veículos de comunicações e da solidariedade entre os países. Ou seja, de bons governantes.

Mais cedo ou mais tarde, o vírus será derrotado. A ignorância pode ser superada. Entretanto, a civilização ainda não criou remédios contra a ganância e o ódio de indivíduos, que costumam se juntar numa categoria batizada de elite. Justamente a que controla as regras da sociedade.

O resultado disso tudo é que, mesmo antes da globalização, pestes ultrapassavam fronteiras. Agora, na modernidade, na era da Comunicação, o que se disseminou pela Terra foi o vírus da desinformação.

E, para citar expressão de outra historiadora, Barbara Tuchman, a Humanidade segue firme na sua ‘marcha da insensatez. Darwin ficaria horrorizado.

Luis Erlanger é jornalista e escritor – https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Luis_Erlanger