ESPECIAL DE FINADOS: A 'grande imprensa', de velha, morreu - 2. Por Manoel Marcondes Neto.

2020 – uma crise sem precedentes atingiu o jornalismo em todo o mundo – que perdeu-se como instituição. Perdeu-se de sua missão de desvelar a verdade dos fatos. Perdeu-se do papel de reserva moral sobre governos. E, consequentemente, perdeu-se do público. Tornou-se, ao lado de políticos e acadêmicos profissionais, mais um propagandista de si mesmo, ao lado de uma infinidade de autointitulados “influencers” às vezes com mais alcance e “seguidores” que ex-órgãos de imprensa tradicional.

Desde a formação – hoje, temos jornalistas mal formados e moldados ideologicamente -, passando pelo falido modo de financiamento do negócio, chegando, finalmente, à perda da credibilidade – coluna vertebral que sustentou a imprensa no século XX.

Por sua vez, a propaganda – outra face do negócio da imprensa – vive idem gigantesca crise com a entrada em cena da díade internet/redes sociais. E o que temos? Agências perdidas e publicitários também mal formados e moldados ideologicamente.

No Brasil, sobra a tal da assessoria “de imprensa”, essa jabuticaba que tornou-se o escoadouro de jornalistas que, em desvio de função, produzem “falsas notícias” sem pudor por estarem “apenas” no meio empresarial, onde a conduta ética sucumbe à concorrência feroz. Afinal, é preciso pagar os boletos.

Resultado: anunciantes “sem lei” e muito marketing “digital”. Grande público sem hábitos de curadoria de conteúdo tentando se salvar atrás de nomes que um dia a “grande imprensa” ajudou a construir – Boris Casoy, J. R. Guzzo, Leda Nagle, Cristina Graeml, Augusto Nunes, Fernão Lara Mesquita, Alexandre Garcia, Paulo Briguet, Lucia Sweet, Luís Ernesto Lacombe, Marcia Peltier, Silvio Navarro, Guilherme Fiuza, Paula Schmitt e Adalberto Piotto, entre outros -, hoje, todos fora dela.

Inteligência em declínio – na infância, na adolescência e na fase adulta. Ninguém lê. Ninguém se comunica. Quanto mais “mídia”, menos comunicação.

Um “começar de novo” precisa ser implementado no início da vida intelectual – no ensino fundamental e no ensino médio. A Educomunicação pretende ser uma saída – hoje em vigor apenas no estado de São Paulo, e, mesmo assim, parcialmente. Importante: na escola, qualquer disciplina de Media Literacy tem que, necessariamente, avaliar diferentes veículos – de todos os portes.

E o empreendedorismo – digo isto em salas de aula desde 2008 – é o único caminho viável para um jornalismo profissional (“O Ofício”, projeto de Gilberto Scofield Jr., é prova cabal disso), mas… fora da “monetização” – o caminho torto do financiamento do tal marketing “digital”. As alternativas à mainstream media são obrigatórias, sobretudo na infosfera.

Observamos ainda que a formação tem sido prejudicada pela substituição constante de professores, declínio de literatura técnica e um número cada vez menor de trabalhos publicados tem tido uso nas salas de aula.

Desde a fundação do O.C.I., em 2013, vimos denunciando o empobrecimento da cobertura jornalística. A redução dos efetivos em Redação e de equipes de reportagem já então nos preocupava, ao passo que testemunhamos o crescimento considerável das empresas de assessoria “de imprensa” – muitas absorvendo os jornalistas demitidos pela crise de assinantes e anunciantes – que também sofreram a ruptura de modelos de marketing “digital” – sem que o conhecimento científico ancorasse a mudança e uma revisão das legislações correspondentes.

A internet e as redes sociais também agudizaram a crise. E, desde 2014, denunciamos o pensamento único que vem varrendo as Redações (e também as agências de propaganda). Manchetes iguais, matérias que são releases integrais e campanhas publicitárias medíocres em torno das mesmas causas de lacração – mesmo que (pasme!) com prejuízo para as marcas.

Soa um réquiem ensurdecedor. O jornalismo – aquele de Gay Talese a Walter Cronkite – morreu. Abram caminho para o féretro!

A título de ilustração, acesse – https://www.youtube.com/watch?v=-l9Vr71TH94.

Acesse a Parte 1 desta história: “A ‘grande imprensa’, de velha, morreu. Só falta enterrar“.