Respeito e sensibilidade de uma 'promoter' para com as relações-públicas e vice-versa. Por Andrea Nakane.

No início do mês de agosto, Alice Regina Alves Cavalcante, conhecida socialmente por Alicinha Cavalcanti, depois de uma batalha gigantesca contra uma doença ainda muito pouco conhecida pela sociedade, a Afasia Progressiva Primária (APP), faleceu aos 58 anos, deixando o mundo dos eventos muito sensibilizado e nostálgico com sua trajetória.

A APP é uma síndrome neurológica rara, relacionada a um quadro de degeneração do cérebro, e que afeta, progressivamente, a linguagem. Essa condição causa alterações cognitivas e comportamentais, reduzindo a autonomia e independência da pessoa acometida, tanto que quando foi diagnosticada como portadora dessa doença, em 2017, Alicinha se recolheu, não mais sendo vista e deixando até mesmo de alimentar suas redes sociais. Além da APP, Alicinha também desenvolveu a esclerose lateral amiotrófica (ELA) e recebia tratamento domiciliar desde então.

Alicinha Cavalcanti começou a carreira aos 20 anos na casa noturna The Gallery, em São Paulo, palco de grandes fenômenos musicais durante a década de 1980, como Tim Maia e Cazuza, tendo como seu mentor e até padrinho, o empresário do entretenimento José Victor Oliva.

Alicinha foi considerada a maior e mais conhecida promoter do Brasil, com um mailing que continha 17 mil nomes de famosos.

Tive oportunidades de trabalhar ao seu lado e sua energia era realmente algo contagiante, emoldurada por um sorriso sempre presente. Ela fazia questão de dizer que era promoter e não RP, demonstrando sua consciência e respeito pela profissão regulamentada, mas não usava sua titulação, pois sabia que era incorreto, apesar de ter verdadeiros atributos vocacionais para ser a mesma, faltando só a formação específica.

Ter essa conduta já dizia muito de seu grau de profissionalismo, pois vemos com frequência pessoas sem formação – e até mesmo sem talento para as relações públicas – se autopropagarem como tal, sem honestamente ser.

No Brasil, a sociedade e a própria imprensa ainda têm dificuldades de identificar o que é ser promoter e o que é ser relações-públicas

A profissão de RP está focada na construção de relacionamentos com os diversos grupos de interesse que orbitam uma organização, de qualquer setor, e nesse caso também podemos pensar na ótica de eventos.

Lidar com públicos tão distintos como a imprensa, convidados VIPs, influenciadores digitais, autoridades e até mesmo o público-alvo de um evento seria o papel do RP, o que pode acarretar resultados de maior sucesso, já que contaríamos com uma visão plenamente profissional para esse estímulo.

A visão multidisciplinar acompanhada da sensibilidade em não só atender mas, sobretudo, entender de gente, faz com que as relações-públicas tenham um papel vital no contexto contemporâneo, trabalhando com paradigmas científicos e sendo elas propriamente ditas um segmento incitador de novos horizontes e conquistas, entre os quais encontra-se o engajamento.

Esse profissional também poderá ser responsável por aplicações de pesquisa de opinião, além de gerar exposições positivas de um evento em todo o campo midiático, seja por veículos da imprensa propriamente dita ou pelas redes sociais próprias da empresa ou do evento.

Já o que se convenciona chamar de promoter tem a característica de, justamente, atrair participantes ou convidados para um evento, geralmente com um viés social para atiçar interessados na compra de ingressos e tickets, que serão, depois, também materiais de trabalho na repercussão midiática.

A palavra promoter vem do verbo inglês to promote (promover algo) e não pode ser confundida com o termo homônimo a que usualmente nos referimos definir quem investe na realização de um evento, o promotor.

O promoter geralmente tem atuação mais concentrada na promoção de festas em boates, danceterias etc., mas pode também ser integrante de uma comissão organizadora de um evento com o propósito de convidar determinados perfis de pessoas ou até mesmo esse novo público em voga na atualidade, chamado de influenciadores digitais.

Percebe-se, então, que a junção dos expertises de RP com um promoter, sem dúvida alguma, pode intensificar os resultados de sucesso de um evento, local, e/ou imagem de uma pessoa física ou jurídica.

Alicinha Cavalcanti foi uma referência como promoter no Brasil e assinou milhares de festas e projetos com seu nome, uma espécie de griffe, simbolicamente fundindo glamour, alegria e muito networking. Sabia do seu papel, e tinha consciência do quanto tinha ao seu lado pessoas que realmente nutriam bons sentimentos por ela e do outro lado, o quanto tinha de interesseiros e aproveitadores. Nunca perdeu a linha e com uma postura educada buscava conciliar e exaltar o bom da vida, reunindo pessoas para celebrar, se divertir e se emocionar. Afinal, compreendia muito bem que a coleção de momentos assim deixaria a trajetória de todos ainda mais especial e cheia de memórias ternas e felizes. As mesmas que terei dela até o fim… ou melhor, até o momento de um novo encontro em outras dimensões, com direito a uma lista de pessoas realmente do bem e do amor, sem penetras para importunar a paz tão merecida.

Andrea Nakane é bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Relações Públicas. Possui especialização em Marketing (ESPM-Rio), em Educação do Ensino Superior (Universidade Anhembi-Morumbi), em Administração e Organização de Eventos (Senac-SP), e Planejamento, Implementação e Gestão da Educação a Distância (UFF). É mestre Hospitalidade pela Universidade Anhembi-Morumbi e doutora em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo, com tese focada no ambiente dos eventos de entretenimento ao vivo, construção e gestão de marcas. Registro profissional 3260 / Conrerp2 – São Paulo e Paraná.