O bom, o mau e o não ético na "web 2.0". Por Ilka Carrera.

Todos os dias temos numa série de problemas e/ou crises de imagem com pessoas públicas bombando na web. Sim, claro que as redes sociais digitais trouxeram uma exposição maior e assim como as organizações não têm mais o poder de controlar a comunicação, ela é agora simétrica e de mão dupla, e, queiram ou não, as celebridades também não podem mais escolher se serão citadas ou mencionadas por um jornalista ou fã no ciberespaço. O canal está aberto para o diálogo, seja para o bem ou para o mal. Se a organização estiver atendendo aos anseios da opinião pública e entregando suas promessas, as publicações serão positivas, mas caso esteja fazendo o oposto, haverá questionamentos e campanhas de boicotes.

Na era do cliente ou fã com o poder da publicação e compartilhamento, os cuidados precisam ser redobrados, bem como é preciso responder aos anseios do seu público, mas há algo de podre no reino da internet dos famosos: os escândalos se espalham de modo totalmente descontrolado causando danos às reputações e relações, e, consequentemente, temos os cancelamentos e as crises. É imperioso observar que salvaguardar a imagem e cuidar dos relacionamentos com os clientes se tornou mais singelo e laborioso ao mesmo tempo, pois requer cautela por parte das pessoas públicas e empresas no sentido de alinhar o discurso e a conduta para saciar as expectativas em jogo.

Trago à baila a questão do profissional de comunicação, pois ele pode ser bom e agir com as estratégias assertivas para conduzir seus clientes ao sucesso cuidando da conduta e da exposição na medida certa ou ele pode simplesmente orientar equivocadamente para o fingimento ou envolvimento em escândalos. A simulação é facilmente desvelada na rede; mau profissional, má assessoria. Claro, tem também o não ético, aquele que fará uso de artifícios pouco respeitáveis, que mais cedo ou logo será descoberto. Nada mais certo na era da informação como a queda das máscaras e falsetes. Como diria o velho bardo, nem tudo que reluz é ouro. Tem-se também o desorientado, ou seja, a pessoa pública que não tem uma assessoria de comunicação.

Para além da conduta dos assessores, chamam atenção também os assessorados que teimam em desafiar o tribunal da internet com exposição excessiva das suas vidas pessoais sem saber lidar com a opinião e a interferência alheia. Nunca antes na história houve tanta celebridade batendo boca publicamente com familiares, fãs e outras celebridades. Antigamente, as pessoas públicas tinham cuidado ao expor suas vidas pessoais para não causar repercussão negativa ou julgamentos. De certo modo havia até um exagero como esconder o estado civil, um filho sem um casamento ou a orientação sexual. Hoje, temos o excesso de exposição da vida privada com direito a factoides e simulações em alguns casos.

Antes de continuar, quero frisar que não tenho apreço ao pretérito. Como baila o tango, el pasado es pisado. O passado está esmagado. Acredito que caminhamos para evoluir e sempre podemos nos superar ainda mais. Deus me livre de passar atestado de cringe, não é mesmo? Mas no que concerne a comunicação de celebridades, penso que vale a pena repensar as estratégias praticadas em tempos remotos. Há uma regra fundamental na gestão de carreiras de pessoas públicas que é definir a linha de comunicação e optar por excesso de exposição na mídia ou exposição controlada. A experiência histórica comprova que controlar a divulgação da vida particular é o melhor caminho ou pelo menos tem menos desgaste e sofrimento. A celebridade mais bem paga e mais requisitada para campanhas publicitarias é aquela que menos se envolve em confusões e crises de imagem com a opinião pública.

Li em diversos depoimentos na imprensa sobre Ivone Kassu, pioneira no ramo de assessoria de imprensa para artistas no Brasil, que trabalhou com grandes nomes da música brasileira, que ela sempre atendia bem os jornalistas. Kassu cuidou da carreira de Roberto Carlos durante 38 anos e sua estratégia era clara – divulgar mais sobre o trabalho e menos sobre a vida pessoal e evitar envolver-se em confusões.

Na letra de Roman, existem três discursos básicos nas organizações: bem-ditos, mal-ditos, e não-ditos. As pessoas públicas também têm seu acervo de mensagens oficiais e bem elaboradas (bem-ditos), os boatos e calúnias que surgem (mal-ditos) e, claro, aquilo que não falam ou preferem não se pronunciar (não-ditos), porém são cobradas pelos fãs e opinião pública igualmente pelo que dizem ou aquilo que não deveriam ter dito ou o tema que não dizem, mas deveriam se manifestar a respeito. É imprescindível administrar todos os discursos. O trabalho de gestão de pessoas públicas é demasiadamente hercúleo nos tempos de redes sociais digitais aliado ao excesso de exposição da vida pessoal. Todo dia na web fazem tudo sempre igual e aparecem os bons, os maus e os não éticos.

Ilka Carrera é relações-públicas, mercadóloga e professora. Mestre em Administração, especialista em marketing e gestão de crises. Consultora em gestão de crises, comunicação e marketing. Administra a página no Facebook e Instagram (@crisesecrises).