365 dias de Natal. Por Juliana Fernandes Gontijo.

Numa tarde de inverno, quando caíam os primeiros flocos de neve na campina, parei debaixo de uma árvore e, por alguns minutos, meus pensamentos voltaram uns cinquenta anos na minha vida. Fui criança novamente. Lembrei-me daquele Natal em que ganhei de presente do Papai Noel, uma caixa enorme. Linda. Como eu gostaria que o tempo tivesse parado naquele ano que infelizmente se foi, e dele, só me restam as boas lembranças do passado. E essa, em especial. Eu e meus irmãos éramos muito pobres, meus pais não tinham dinheiro para os presentes, então resolvi pedir ao bom velhinho…

Voltando à caixa. Não sei a que horas da madrugada, falei baixinho com um irmão:
– Será que o Papai Noel já deixou o meu caminhãozinho de madeira? Ele fez que não com a cabeça; voltamos a dormir. Sonhei com um homem de branco, meio alto, que tinha um olhar bastante amável… Não sei, mas tive a impressão de conhecê-lo de muito tempo. Eu e meu irmão brincávamos junto com mais crianças no meio de um campo coberto de flores e, mais ao fundo, umas pedras chegavam até um rio cristalino. Aquele homem também nos contava histórias bonitas; dizia o quão era importante ser bom para os outros. O quanto nós deveríamos fazer o bem sem se importar em receber algo em troca. Ao mesmo tempo em que eu brincava, prestava à atenção nas lindas estórias dele.

Vez por outra, chegavam pessoas, umas pareciam ser viajantes, que pediam conselhos; pessoas pobres preferiam comida e roupas. Estranho mesmo era como ele conseguia tudo sem que víssemos coisa alguma e entregava àquela gente tão necessitada. Eu observava aquilo tudo, mas sem entender do que acontecia. Naquela campina, não havia lugar para esconder objetos. Muito estranho…

Depois de algumas horas, o homem de branco chamou-me debaixo de uma linda árvore:
– Menino, eu tenho uma coisa para você. Vire-se de costas, por favor. Obedeci. O homem, porém, não tinha nada nas mãos. Virei, em questão de segundos e, novamente na posição original, meus olhos quase pularam do meu rosto. Era uma enorme caixa, colorida em tons mais claros e pastéis, muito diferente das que eu estava acostumado a ver naquele tempo.
– Menino, sei que hoje é seu aniversário e este é meu presente.

Aquilo era engano, o meu aniversário já havia passado… Fiquei meio sem jeito de receber aquela caixa, e, mesmo assim, ele me pediu que a abrisse. Veio o meu desapontamento:
– A caixa está vazia!

A resposta foi bastante rápida, porém muito sábia:
– Não está vendo, não é? Assim como não vê meu coração, mas tudo que desejo de bom para você, guardei aí dentro. Amor, alegria, carinho, paciência, compaixão, bondade, perdão, resiliência, sabedoria, paz, saúde e muitos outros sentimentos bons que você também quiser guardar.

Eu não tive mais palavras além de um “muito obrigado”. Quando me levantei, a fim de abraçar o homem tão bondoso, ele já havia desaparecido. Naquele momento ouvi um barulho, muito alto. Jamais consegui entender o que fora aquilo. Já era tarde, levantei na hora do almoço e corri para a árvore, pois queria ver se meu caminhãozinho estava lá. Para a minha surpresa, encontrei a mesma a caixa colorida na sala. Lembrei-me do sonho, sentei ao pé da árvore de Natal e comecei a chorar, não sabia se era de tristeza ou de alegria, mas chorava muito… Pensei no quanto eu era feliz e poderia guardar no meu coração tudo o que meus pais e aquele homem do sonho haviam me ensinado para que eu pudesse repassar às outras pessoas. Fui entender que todos os dias na vida são Natais dentro do nosso coração (ou da nossa caixa) como quisermos, se realmente aproveitarmos as nossas oportunidades. Aprendi que devemos compartilhar somente os nossos bons sentimentos com outras pessoas, sem nos preocuparmos com o que receberemos em troca. Este é um grande passo para nos tornarmos melhores a cada dia…

Ah, o meu caminhãozinho? Na verdade, ganhei um quebra-cabeças todo de madeira. Mas a caixa do meu sonho foi muito mais importante na minha vida.

Imagem: Pixabay.

Juliana Fernandes Gontijo é jornalista por formação e atriz. Apaixonada pela língua portuguesa e cultura de maneira geral, tem bastante preocupação com sustentabilidade e o destino do lixo produzido no planeta.