Rádio educativo. Por Luiz André Ferreira.

Ao contrário da TV, o rádio surgiu no Brasil em 1923 para fins educativos. Porém, na década de 1930, ele foi transformado em atividade comercial pelo presidente Getúlio Vargas. Na esteira da missão inicial, a pioneira foi a “Rádio Sociedade do Rio de Janeiro”, doada em 1936 ao então Ministério da Educação e Saúde e rebatizada de “Rádio MEC”. É mantida no ar, ininterruptamente, até hoje, e agora está sob o guarda-chuva da estatal EBC. O próprio fundador, Roquette-Pinto, já dizia que “o rádio é a escola de quem não tem escola”.

Seguramente, o rádio é o mais mutante e adaptável dos meios de comunicação de massa. Constantemente alardeado como tendo seus dias contados, por conta de mídias emergentes, sempre deu o “pulo do gato” se reinventando e driblando sua propagada extinção. Aliás, “O pulo do gato” é o título de um dos mais longevos programas brasileiros. No ar desde 1973, pela Rádio Bandeirantes, esteve sob o comando do jornalista José Paulo de Andrade até sua morte por Covid-19, em 2020. Diga-se de passagem, tive a honra de trabalhar nesse programa com o apresentador.

Com tantas mudanças, o rádio abdicou de algumas potencialidades, como o atendimento ao público infantil, inclusive para fins educacionais. Fez isso assim que a TV se consolidou neste segmento, em boa parte por conta da importação dos violentos enlatados desenhos norteamericanos e japoneses. Tanto que entre as décadas de 1960 e 2000, a TV era tida pelos pais como babá eletrônica e foi introduzida nas escolas por projetos governamentais como complemento educacional.

De lá para cá, poucas experiências radiofônicas foram realizadas para a educação infantil. Destacam-se o “Encontro com Tia Heleninha”, na estatal “Rádio Nacional da Amazônia”, na década de 1980, e a “Rádio Maluca”, comandada pelo radialista e educador Zé Zuca, veiculada nos anos 1990 pela “Rádio MEC”.

A prova de que o veículo ainda tinha potencial entre as crianças, foi o boom das músicas infantis nos anos 1990 e 2000. As canções voltadas para esta faixa etária, antes sem um espaço específico para este público, invadiam as paradas de sucesso e disputavam com as adultas os primeiros lugares. Os que mais se destacaram foram Xuxa, Mara Maravilha, Angélica, Balão Mágico entre outros.

Agora, com essa pausa para reflexão que o mundo está dando por conta do isolamento da Covid-19, o rádio tem uma nova chance de reconquistar essa faixa que negligenciou. Pode, por exemplo, aproveitar oportunidades e comportamentos mercadológicos atuais, como o sucesso dos podcasts específicos voltados para crianças, por exemplo. Ou, ainda, aproveitar o vácuo que emissoras de televisão abriram, após as mudanças na legislação – que restringiu a publicidade infantil. Hoje, somente os canais por assinatura mantêm uma programação específica, com raríssimas exceções, como as honrosas estatais TV Brasil e TV Cultura.

Outra boa oportunidade de avaliar o retorno a este segmento, são as aulas remotas. Nos grandes centros, o auxílio da mídia neste momento emergencial vem ocorrendo nas poucas janelas abertas em algumas emissoras de televisão menores. Contudo, quem está garantindo mesmo a viabilidade da educação e auxiliando professores é o rádio, principalmente em pontos mais remotos e carentes do país.

Luiz André Ferreira é jornalista e professor universitário. Mestre em Bens Culturais e em Projetos Socioambientais. Pioneiro, em 2002, com o lançamento da coluna “Responsabilidade.com” sobre ética e sustentabilidade no jornal Le Monde. Tem passagens pela Reuters e grupos Folha, Estadão, Globo, Bandeirantes e Jornal do Brasil.