A “monetização” da internet é a causa de muitos males que atualmente sofremos.
Era óbvio que um dia viria a “conta” da proverbial “gratuidade” da web.
Não posso afirmar que os seus criadores sabiam disso… provavelmente, sim.
Sobre o preço a pagar, vale a pena ouvir – vide link – o que nos tem a dizer Jaron Lanier, um ser típico do Silicon Valley.
Pequeno histórico
O meio militar, onde a internet nasceu, é setor com “licença para gastar”. E o meio acadêmico – que sucedeu a indústria da guerra no uso e no desenvolvimento da grande rede – idem.
Mas, depois, vieram as empresas. E, como sabemos, empresas são construtos humanos movidos a lucro.
É claro que a história da web – de uns 70 anos mais ou menos – está cheia de pioneiros idealistas e, até, de filantropos. Porém, o inevitável interesse pela “nova mídia” se estabeleceu – principalmente nas últimas duas décadas.
Primeiro, os provedores de tráfego e guarda das informações, depois os data centers prestadores de serviços. Desde o início, muitas empresas investiram em seus próprios “centros de processamento de dados” mas, hoje, a infraestrutura está muito mais distribuída e, com isso, mais barata – e, consequentemente, mais “popular”.
No começo, pagava-se para ter um simples endereço de e-mail (há quem pague por isso ainda hoje!). Meu primeiro e principal e-mail (no Yahoo!) é de 1999, e já o tive gratuito.
Os domínios – administrados por cada país – têm um custo ínfimo e há ferramentas gratuitas para a construção de “páginas” ou websites (blogs, portais, marketplaces etc.).
Todo um ecossistema se estabeleceu, então, e a própria mídia tradicional se viu obrigada a adotar o novo suporte “digital”. A mídia eletrônica rendeu-se (TV se tornou webTV, o meio Rádio se tornou web-Radio) e a própria mídia impressa também – e passamos a ter web-Revistas, web-Jornais e web-Livros.
Um último degrau – a web-Telefonia (ou telemática – integração da telefonia com a informática) requer informação adicional. No início, estabeleceu-se uma “guerra”; as gigantes da telefonia perceberam que a voz sobre IP (VoIP ou Voice over Internet Protocol) iria minar seus ganhos e congestionar suas redes (até então, majoritariamente físicas). E isto, sem falar do tráfego de dados (de empresa-a-empresa) -, um grande desafio legal, de regulação e de negócios. [O modo streaming (transmissão online dedicada – usuário-usuário – em tempo real) é, hoje, “o” instrumento de ponta].
Big data – Big business
Mas, como é proprio do meio empresarial, acordos foram sendo feitos, fusões, aquisições, parcerias e divisões de ganhos foram se estabelecendo, bem como investimentos – muitos investimentos. E chegamos ao momento atual – em que há abundância de meios, players, recursos tecnológicos e, principalmente, demanda. Todo mundo quer ter “sua lojinha” na internet… e precisa “otimizar” a sua “encontrabilidade”. Se antigamente usávamos o Guia Rex para encontrar um endereço numa cidade e as Páginas Amarelas para encontrar o telefone de fornecedores de tudo, hoje, as nossas procuras se dão por alguns toques na linha de pesquisa do Google – operação que ganhou até verbete no dicionário, um novo verbo: “guglar”.
A boa e velha publicidade foi a via da entrada do dinheiro (de anunciantes e de consumidores) na web. Mas, desconfio que os esforços de adaptação do ferramental tradicional das agências de propaganda não foram suficientes para abarcar a “nova mídia” e seus novos “veículos” – tanto que muita gente boa ainda confunde as duas coisas. E o – virtuoso – modelo brasileiro vem desmoronando há uma década, mais ou menos o tempo em que entrou em cena o tal do “marketing digital“, algo totalmente desregulamentado. (Aqui, no portal O.C.I., inúmeras matérias tentam compreender e analisar esta nova “disciplina” – que, a meu ver, ainda está longe de ser ciência).
Um monstrengo chamado “mídia programática” iniciou o jogo, desmontando toda a lógica e a praxe do negócio anunciante-agência-consumidor. Baseada em algoritmos (“ad sense” e “ad words”, do Google, são pioneiros “bots”), a veiculação de material publicitário (cards, posts, short videos, “publis”) passa a atingir alvos individuais via smartphones conectados à internet, e isto explica: (1) a queda vertiginosa de audiência dos veículos eletrônicos tradicionais (rádio, TV e cinema), e (2) a transformação que toda a indústria da propaganda teve que fazer (e ainda está fazendo) para adaptar-se aos novos hábitos e tecnologias.
Só que a legislação ficou para trás. Há falta de instrumental jurídico para lidar com “fake news”, “cancelamentos”, “flash mobs” e “influencers” – para o bem e para o mal. A União Europeia – com a GDPR -, e o Brasil – com a LGPD -, cuidaram de alguns aspectos importantes da privacidade dos dados pessoais dos usuários da web, mas ficou só nisso.
Injúrias, mentiras, sofismas, difamações e calúnias pululam no ambiente digital e nem sempre as reparações chegam a tempo. Até o suicídio (de jovens, sobretudo, envolvidos em “jogos” e threads online) teve crescimento só explicável pela entrada em cena de novos “veículos” viciantes e locus preferencial para fofocas, maledicência e demolição de reputações.
Nós, do Observatório da Comunicação Institucional, colocamo-nos à disposição para participar do urgente debate dessas questões que, em nosso campo, tanto espaço têm para prejuízo da comunicação institucional, tanto de personalidades públicas quanto de organizações em geral.
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Manoel Marcondes Neto é cofundador e diretor-presidente do O.C.I.