Esquecemos a importância do 'por que'. Por Luiza Vaz.

Por volta dos 4 anos de idade, as crianças entram naquela fase do ‘por que isso?’’ e do ‘por que aquilo?’. Emendam uma pergunta atrás da outra tentando entender e conhecer melhor o mundo ao seu redor. E nós adultos rimos delas e até chegamos a perder a paciência pelos inúmeros ‘por que’ consecutivos delas. A impressão que passa é que por sermos mais velhos sabemos de tudo. E muitas vezes passamos a acreditar nisso também. Mas, será que sabemos mesmo de tudo? E precisamos saber?

Esse pensamento de que precisamos saber de tudo pode ser consequência da forma como fomos ensinados na escola. O filósofo e educador Paulo Freire já questionava a metodologia tradicional das instituições de ensino denominando-as de ‘educação bancária’. Ele dizia que é aquela filosofia em que o educador fala e o aluno obedece, tornando indivíduos passivos e não questionadores. Ruy Cézar do Espírito Santo também vai na mesma linha em seu livro ‘Pedagogia da Transgressão’. Ele aponta que a escola tradicional acaba obrigando seus alunos a dar respostas em troca de uma nota, não sendo uma educação para a vida e sim apenas para passar de ano.

Sociedade do desempenho

Essa mania de ter resposta para tudo acaba nos transformando em robôs. Robôs fazedores de coisas e não seres humanos pensantes. A reflexão e o questionar acabam sendo vistos como coisas ruins para o homem moderno. Como se isso o tirasse do modo automático e o fizesse ‘perder’ o tempo crucial do dia-a-dia. Como se diz, time is money. E isso só se agrava com o capitalismo deste século – que nos exige cada vez mais sermos produtivos e sabermos fazer de tudo, numa cultura do Do It Yourself.

No livro ‘Sociedade do Cansaço’, o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han afirma que a característica do homem do século XXI é aquela em que o indivíduo está em busca eterna por melhor desempenho e produtividade. E com isso, evita o descanso para não perder o caminho para o sucesso. Ele chega a usar o termo ‘sociedade do desempenho’. ‘O sentimento de ter alcançado uma meta definitiva jamais se instaura. Não é que o sujeito narcisista não queira chegar a alcançar a meta. Ao contrário, não é capaz de chegar à conclusão’, afirma Han.

Voltamos a ser crianças?

No entanto, o momento em que vivemos agora tem exigido da sociedade e cada um de seus indivíduos de parar e questionar sobre a vida. A pandemia, o isolamento social e o inimigo invisível nos obrigaram a tomar a decisão drástica de diminuir a nossa produtividade diária e a refletir sobre onde estamos. Nos obrigou a ficar mais com nossa consciência e menos com as pessoas. E acabamos voltando a ser crianças com seus ‘por que’ para tudo. Por exemplo: ‘Por que chegamos a uma pandemia se o vírus começou do outro lado do mundo?’; ‘Por que a imprensa só fala de Covid-19… não têm outras notícias ou crimes acontecendo?’; ‘Por que não encontram logo uma cura, um remédio eficiente contra esse vírus?’; ‘Por que alguns morrem e outros não?’.

O ‘por que’ se estende para outras áreas da nossa vida, como: ‘Eu estava no lugar onde gostaria de estar?’; ‘Antes da pandemia eu era feliz?’; ‘Estava satisfeita na profissão?’; ‘Eu estava seguindo o caminho por conta própria ou estava deixando o vento e a maré me levarem, pois estava cômodo para mim?’; ‘Eu estava pensando no coletivo ou estava concentrado demais no que eu precisava e não do que precisamos todos?’.

E por mais que tenhamos tantos ‘por que’ na nossa cabeça, não temos a resposta para todos eles. Voltamos a ser aquelas crianças questionadoras e isso é bom. Acredite. Neste momento de pandemia estamos sendo obrigados a parar, a ser menos produtivos, a ficar em casa. E a aceitar que não tem problema ser menos produtivos, não ter respostas para tudo e voltar a escutar o lado crianças de perguntar ‘por que’ para tudo. Talvez seja mesmo o momento de questionarmos mais do que termos as respostas na ponta da língua. E, TUDO BEM.

Luiza Vaz é jornalista graduada desde 2011 no Centro Universitário Uniceub, em Brasília. E pós-graduada em jornalismo esportivo pela Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), em São Paulo. Nos últimos anos, tem trabalhado com assessoria de imprensa e marketing de distribuidoras e exibidores de cinema multinacionais.