EaD e a corrida do ouro: mais do mesmo? Por Aline Carneiro Silverol.

Muito se tem falado sobre o ensino a distância, mas como ele pode ser definido?

O Ensino a Distância, de acordo com a definição do Ministério da Educação, é a modalidade de ensino na qual o processo de ensino-aprendizagem ocorre a distância, por meio da internet.

Após o Decreto Nº 9.057, de 25 de maio de 2017, que liberou a abertura de polos de EaD sem visita do Ministério da Educação, a quantidade de polos no Brasil mais que dobrou. Entre maio de 2017 e maio de 2018, a oferta saltou de 6.583 para 15.394, de acordo com o Ministério da Educação, ou seja, um aumento de 133% na oferta.

A Educação a Distância tem ganhado destaque nos últimos anos por possuir um custo reduzido para o aluno-cliente, mensalidades mais acessíveis e diminuição de custos associados, tais como transporte e alimentação. Além disso, apresenta outras vantagens: o ato de aprender pode acontecer em qualquer lugar e a qualquer hora, pois o aluno administra seu próprio tempo; metodologias de ensino mais atrativas e dinâmicas, dentre outras. E a redução de custos também se aplica às Instituições, que podem recuperar os investimentos em médio prazo.

O aumento exponencial da oferta de cursos totalmente a distância e disciplinas para os formatos híbridos (parte presencial e parte a distância) também tem movimentado o mercado de produção de conteúdo, com a atuação de empresas de tecnologia educacional. Essas empresas buscam a utilização de metodologias inovadoras, linguagem dialógica e muita interação.

Além disso, tais metodologias visam transformar disciplinas curriculares em formatos mais simples, sem prejuízo ao conteúdo programático. Nesse processo, o aluno é visto como um usuário e as metodologias devem oferecer experiências; as mesmas ou até melhores do que as que ele vivenciaria no formato tradicional.

Mas será que todas as instituições estão preocupadas com a qualidade e a diferenciação dos seus materiais didáticos?

EaD, antes de mais nada, não é inovação. Já existe há algum tempo, talvez antes mesmo das revistas do Instituto Universal Brasileiro (quem não se lembra?), que levava a todos os cantos do Brasil, até onde os Correios conseguissem chegar, um ensino de caráter ‘técnico’. A inovação, nos dias atuais, consiste nas metodologias de ensino e na forma como o conteúdo é ‘transmitido’, por que novos, também, são os seus usuários.

As projeções com relação ao números de matrículas, se mantiverem a tendência mencionada no início deste texto, mostram que, em 2023, teremos mais alunos matriculados em cursos a distância do que alunos no ensino presencial. Para o mercado, isso é animador. Imagine… para uma instituição… ter milhares de alunos matriculados, mas com custos bem menores se comparados aos do ensino presencial? Custo menor significa maior lucratividade.

Apesar dos meios usados para a aprendizagem, tais como celulares, tablets e outros eletrônicos, tudo estar disponível na rede, na ‘nuvem’, entre outras plataformas, os materiais, na maioria das vezes, continuam a ser mais do mesmo.

O tradicionalismo da sala de aula e dos professores ainda se reflete nos materiais didáticos e nos vídeos. Há um descompasso entre os professores, os conteúdos e os alunos.

Os professores são do século XIX: aulas maçantes, sem perguntas motivadoras, sem ganchos entre os assuntos. A aula gravada em estúdio, com aquele fundo verde, e o professor falando, falando, remete à mesma sala de aula que não é inovadora. Só muda o local. Pois até a postura do professor é a mesma.

Os conteúdos são do século XX: a maioria dos conteúdos e conceitos são atemporais, mas podem ganhar uma nova roupagem, com a utilização de exemplos do dia a dia, a proposição de desafios para instigar a reflexão, animações, games, quiz, canais do YouTube. Existe muita coisa que pode ser aplicada e adaptada para transformar um conteúdo em uma experiência, mas temos uma barreira a ser transposta: a formação do professor, que será objeto de outro artigo.

E os alunos são do século XXI: representam o agora, o instantâneo, o líquido. Se não tivermos a sensibilidade de nos aproximar do mundo dos alunos, das redes sociais, das mídias e de tudo o que os cercam, estamos fadados a encontrar, em todas as aulas, aqueles alunos desinteressados, ou, no caso dos conteudistas, ofensas à distância.

Para não estarmos sujeitos às frustrações em sala de aula, como conteudistas e como professores, é necessária uma disrupção no pensamento tradicionalista e engessado do século XIX. Encarar o ensino como algo dinâmico, líquido e acessível possibilitará enxergar os conteúdos de uma forma mais leve, sem perder a profundidade que exigem, e transformá-los em experiências, sim, por que não?

Eu vejo os alunos como indivíduos (não somente como usuários de uma plataforma) que gostam e precisam de sensações. Especialmente no ensino a distância, em que eles são ‘privados’ de convivência física e interações pessoais, mas não devem ser privados de sensibilidade.

Eu busco, na construção dos meus materiais e aulas, aquela sensação do aluno pós-leitura: – Puxa vida, entendi!

E você, professor, o que busca?

Aline Carneiro Silverol, conteudista e professora universitária, é doutora em Geociências pela Universidade de São Paulo e uma apaixonada pela Educação e pela formação docente.