De jaboticabas a "ninjas". Notas sobre o que é e o que não é Jornalismo.

O QUE NÃO É JORNALISMO

Assessores de imprensa, essas brasileiríssimas jaboticabas.

Em diversos comentários anteriores, aqui e em outros ciberespaços, dediquei-me a demonstrar que assessoria de imprensa – essa invenção brasileira – tem mais efeitos deletérios que serviços prestados à cidadania e à própria noção do seja informação. Acesse aqui uma delas.

A difícil e nobre tarefa de formar relações-públicas na graduação (a que dediquei-me por 24 anos) e jornalistas, na pós-graduação (a que dedico-me há mais de uma década), fica ainda mais complexa porque a mídia – justamente o locus, a arena do exercício dessas profissões, não abre espaço para o tema… mídia. Isto porque vivemos no Brasil, desde 1962, um genuíno “coronelismo midiático” (mais adiante descubra o porquê) .

Agora, hoje mais precisamente, uma nota perdida na coluna “Panorama Político”, de Ilimar Franco, n’O Globo (página 2), vem em meu socorro, narrando episódio exemplar da inversão de valores em que se transformou o toma-lá-dá-cá entre “quem é notícia” e “quem difunde notícia”.

À íntegra da nota [os colchetes, meus, fazem-se necessários]:

No ar o plantão da madrugada

O Senado se rebelou ontem contra os assessores [de imprensa] que dirigem a TV Senado. Estes decidiram reprisar as sessões da Casa depois da meia-noite [ou seja, no dia seguinte], exibindo no horário nobre programas estrelados por seus jornalistas. Roberto Requião perguntou: “De quem é a TV? É dos jornalistas que nela trabalham?”. Pedro Taques sentenciou: “Não cabe a eles decidir o que será transmitido”. Randolfe Rodrigues definiu: “Impensada decisão”. Álvaro Dias protestou: “Não é de madrugada que a população poderá nos fiscalizar”. Paulo Paim resumiu: “Jogar para depois da meia-noite? Aí, não dá!”. Eles querem que a Mesa coloque ordem na TV institucional do Senado e dos senadores.

É claríssimo! Um fato grave que só um bom jornalista sintetiza numa nota e tem a coragem de assinar. Eu mesmo, nesta madrugada, só em torno de 3 horas da manhã, é que pude ver com meus próprios olhos, na TV Senado, a aprovação da medida que estendeu (ontem) os efeitos da Lei da Ficha Limpa aos assessores dos gabinetes senatoriais.

O QUE É, SIM, JORNALISMO

E não é que na mesma edição de hoje, d’O Globo, na página 19, Zuenir Ventura – decano da profissão, talvez num surto de  “febre JB” – desautorizou todos os seus colegas de redação postos, há já uma semana (veja aqui), a desqualificar a entidade “mídia NINJA”?

Escreveu o mestre Zuenir: os Ninjas (sic) não inventaram o jornalismo e também não vão acabar com ele. A seu favor, porém, o fato de que, apesar dos possíveis equívocos e da inocente presunção, eles tiveram o mérito de fazer com a imprensa o que as manifestações fizeram com a política: refletir sobre si mesma. Um pouco como esses novos atores da cena nacional fizeram ontem [na Casa do Saber, que agora é de propriedade d’O Globo] com este velho jornalista – ou “pós-jornalista”.

Zuenir Ventura matou a charada: pós-jornalismo. Algo que veio para ficar, sobretudo pós-tecnologias telemáticas acessíveis a todos. Nada mais será como antes. E não fora o próprio jornal O Globo que criara o “Eu-repórter”, estimulando qualquer pessoa a fazer sua reportagem sobre os fatos que testemunha?

Pobres coleguinhas. Agora ganharam mais esta concorrência – a de qualquer um. E pobres leitores, pois lerão, assistirão e navegarão matérias sem apuração, sem contraparte, sem ética profissional.

O jornalismo já perdera a prerrogativa de exigir diplomas universitários de seus candidatos a praticantes, não tem um código de ética com força de lei porque os patrões empenharam-se no lobbying contra a criação de Conselhos Profissionais (Federal e Regionais) para os jornalistas e, agora, repórteres e redatores experientes perdem lugar – porque “caros” – para neófitos pinçados na parentela dos donos dos veículos, de norte a sul do Brasil – como aliás, já pontuara Aydano André Motta… Lamentável.

Por isso tudo é que o Observatório da Comunicação Institucional apoia as seguintes causas dos jornalistas brasileiros:

– Pela restauração da exigência de diploma de nível superior para o exercício da profissão de jornalista;

– Pela criação do Conselho Profissional da classe;

– Pelo estabelecimento do novo marco regulatório da comunicação no Brasil, já podre de velho pois que datado de 1962.

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Sobre Marcondes Neto

Bacharel em Relações Públicas pelo IPCS/UERJ. Doutor em Ciências da Comunicação pela USP, sob a orientação de Margarida Kunsch. Professor e pesquisador da Faculdade de Administração e Finanças da UERJ. Editor do website rrpp.com.br. Secretário-geral do Conrerp / 1a. Região (2010-2012).