A África do Sul é aqui. Copa, 'capos' e culpa numa nação mestiça.

MADIBA

MANDELA: TRADUÇÃO HUMANA DA IDEIA DE UBUNTU – EXEMPLO PARA O BRASIL E PARA O MUNDO

O programa Sem Fronteiras, da Globo News, reprisado ontem como um tributo a Nelson Mandela, que morreu ontem aos 95 anos, mostra um país “panela-de-pressão” após 20 anos sem apartheid oficial – mas com um apartheid econômico-social impossível de ser superado pacificamente.

Mas aí, vem a cálida voz de Madiba, e nos diz: “tudo parece impossível até que acontece”. E o diz com autoridade, porque fez o impossível acontecer em sua longa vida.

As imagens de favelas, pobreza e desigualdade gigantescas lembram o Brasil, outro membro dos BRICS – e percebemos como somos parecidos e como estamos mal, num mesmo barco à deriva, África do Sul e Brasil.

CLIPPING: VAMOS “OUVIR” DOIS HOMENS BRANCOS, UM HOMEM NEGRO, HOJE BANIDO, E UMA MULHER NEGRA (trechos transcritos, extraídos da edição do programa)

O programa conversou sobre Mandela e a África do Sul com:

Mikhael Kahn, economista

– Essencialmente, a reconciliação de diferenças é possível. Acreditar em si mesmo, entender a importância da dignidade humana, e, sem dúvida, a força do espírito humano. Ele é um exemplo disso tudo. Coragem. Mas acho que o real legado tem que ser a habilidade de, não apenas conseguir uma transição pacífica aqui, como reconciliar interesses e grupos que competem entre si – como ele fez. Isso, além da divisão entre brancos e negros. Ou seja, ele conseguiu com grande sucesso, equilibrar interesses, dialogar e reconciliar pessoas. Um negociador muito bom.

Nonzwakazi Sgwentu, assistente social

Tudo o que Nelson Mandela e seu grupo conseguiram – a luta deles foi sempre sob o guarda-chuva de Ubuntu. Eles nunca agiram fora de Ubuntu. Então o legado para nós, sul-africanos, nós temos que olhar para trás e saber que nossos antepassados tiveram sucesso porque preservaram Ubuntu. E não estou dizendo… ser ignorantes quando falamos em educação, ou quando se trata sobre o que os ocidentais estão fazendo. Nós somos globais, mas está na hora de mostrarmos Ubuntu para o mundo. Foi por causa de Ubuntu que chegamos onde chegamos na África do Sul, nos levou a não estar em luta, mas ganhar a democracia. O que é Ubuntu? A tradução seria: eu sou quem eu sou devido ao que você é. Você é o que é devido ao que eu sou. Então a vida é… você não tem vida se a outra pessoa não tem vida. Se a outra tem vida e você não, ela não pode aproveitar a vida. Então nós temos que crescer juntos o tempo todo.

Tseliso Thipanyane, especialista em direitos humanos

Ficamos muito orgulhosos em ser o primeiro país africano – um país muito mal visto –  a sediar uma Copa do Mundo. Também existiram expectativas sobre os benefícios que a Copa traria para o povo sul-africano. Mas isso não aconteceu. Apenas alguns poucos se beneficiaram do campeonato. As empresas envolvidas na construção dos estádios – essas tiveram contratos gigantescos. Por isso ficou um sabor amargo entre o povo sul-africano. O campeonato chegou e foi embora e nada realmente mudou, além da questão sentimental. E o que aconteceu ao longo dos últimos 18 anos é que algumas pessoas do partido CNA vieram com muita política e leis, mas acho que, basicamente, a elite do CNA esteve mais interessada em enriquecer e esqueceu dos pobres. É por isso que nós temos mais de 40% de pessoas que vivem na pobreza. As pessoas estão ficando cada vez mais impacientes. Em 1994, promessas foram feitas. Mas foi uma mentira para todos. São muito pacientes, mas 20 anos depois, as pessoas estão começando a dizer: “espera aí, nada está acontecendo”. Então vemos muitos protestos nas ruas pedindo serviços sociais, habitação, água.

Richard Dowden, diretor da Royal African Society

A economia sul-africana sempre foi muito guiada pela mineração. E os empregos na mineração caíram muito, porque agora tudo é mecanizado. O emprego formal diminuiu, enquanto a população cresceu bastante. Então há um problema grave neste aspecto. Os níveis de educação na África do Sul são muito baixos. Parte da estratégia do CNA foi boicotar as escolas em um certo ponto. Uma geração inteira nos anos 1980 não teve educação porque eles estavam nas ruas lutando contra o Estado. E até agora os professores recebem baixos salários, as escolas não têm manutenção adequada. Talvez devessem ter tido a educação como principal condutor da economia. E eles não tiveram.

COMENTÁRIO

Tudo em Mandela pode inspirar aqueles que escolhem trilhar uma carreira em relações públicas. A crença em si mesmo, baseada em valores nos quais de fato se acredita e se pratica; a empatia que capacita você a colocar-se no lugar do outro; e a perseverança a toda prova. A busca incessante do diálogo, da negociação, e da paz.

“Toda profissão tem um propósito moral. A Medicina tem a Saúde. O Direito tem a Justiça. Relações Públicas têm a Harmonia – a harmonia social”. (Seib e Fitzpatrick, Public Relations Ethics, 1995). In SIMÕES, Roberto Porto. Informação, inteligência e utopia: contribuições à teoria de relações públicas (2006).

Sobre Marcondes Neto

Bacharel em Relações Públicas pelo IPCS/UERJ. Doutor em Ciências da Comunicação pela USP, sob a orientação de Margarida Kunsch. Professor e pesquisador da Faculdade de Administração e Finanças da UERJ. Editor do website rrpp.com.br. Secretário-geral do Conrerp / 1a. Região (2010-2012).