A separação global e termos nocivos usados pela imprensa. Por Jéssica Freitas.

Ouvi dizer por aí  –  e não foi pouco –  a respeito do tal casal global que se separou recentemente. Os da vez foram os atores José Loreto e Débora Nascimento. Soube que eles têm uma filha chamada Bella, de poucos meses de idade, e que a separação não foi nada amigável, pois foi em decorrência de uma traição, o que é triste para o casal, afinal, nenhum término é realmente fácil e, quando se tem filhos e se é uma pessoa pública, as coisas tendem a ser ainda mais difíceis. Entretanto, nem é sobre eles que quero tratar hoje.

O que me decepciona é que, em pleno 2019, uma terceira pessoa tenha sido incluída nesse drama da vida real como aquela que provocou a separação do casal feliz –  a vilã da história, a dama destruidora de lares, ou como quer que queiram chamá-la. Em geral, a imprensa usou o termo ‘suposto pivô da separação’ para se referir à atriz Marina Ruy Barbosa, que nem se sabe se tem mesmo alguma coisa a ver com o lance todo do casal Loreto-Nascimento.

O que é isso de pivô? Recai sobre Marina a suposta responsabilidade de ter destruído uma relação, mas se foi Loreto quem traiu Débora, quem é que foi o responsável pelo divórcio, senão ele? Replicar o termo ‘pivô da separação’, assim como fez grande parte da imprensa, é reforçar a ideia de que um homem adulto como José Loreto foi seduzido (coitado…) por uma outra mulher cruel e acabou sendo obrigado a trair a esposa. Ou seja, é mais uma daquelas expressões que só reforçam o machismo já enraizado em nossa cultura.

Não só a imprensa tem culpa nisso, claro. As próprias novelas nas quais todo esse renomado elenco já trabalhou também reforçam tal tipo de pensamento. Assim como estimulam ainda a repetição do tal do ‘em briga de marido em mulher, não se mete a colher’, expressão que leva muitos vizinhos a não reagirem a casos de violência doméstica. Afinal, será que Elaine Caparroz, a empresária que foi espancada no Rio de Janeiro, teria que pedir socorro por quatro horas até ser atendida, se não fossem pensamentos como esse?

Quem trabalha com comunicação precisa atentar para não fazer uso de termos nocivos em seus conteúdos. Afinal, influenciamos nossa audiência, que reage pelas ruas e pela web -  e muito temos notado o impacto que uma informação mal comunicada pode gerar. Não é só mais uma questão do tal do politicamente correto, mas é verdade: não dá mais para usar termos como deficientes ou incapacitados ao tratar-se de uma pessoa com deficiência. Assim como o verbo denegrir pode ser facilmente trocado por difamar.

Pelos anos que venho trabalhando em redações on line, eu conheço bem a batalha por audiência. Sei que muitos veículos vão até o inferno pelos cliques dos internautas e o mercado cruel da comunicação é assim mesmo.

Com caça-cliques, os sites conquistam visualizações, elas se somam às métricas e se misturam aos números. Só que nem sempre um título socialmente inadequado dá o resultado esperado e segura a audiência estimada para o mês. Vale a aposta?

Por outro lado, a mídia que não lida com a responsabilidade que tem sobre seus títulos e conteúdos perde a chance de fazer um jornalismo consequente, tão raro e necessário nos tempos atuais.

Afinal, termos fáceis e imorais são típicos de comunicações feitas pelo WhatsApp e por meio de outros replicadores das chamadas fake news. Não deveriam, portanto, emplacar numa imprensa que se diz séria e preocupada com a sua credibilidade.

Jéssica Freitas é jornalista e comunicadora digital, apaixonada por Educação e pelo marketing de conteúdo. Estudou Jornalismo na USJT e Letras na FFLCH-USP. Trabalha com jornalismo online e com mídias sociais há sete anos, acumulando experiências nas redações dos portais iG, Terra e Yahoo, dos jornais Diário de São Paulo e O Estado de S. Paulo, e do Canal Rural.