PENSANDO ALTO - A individualidade do controle.

Desde pequenos fomos familiarizados com valores e costumes que moldam a nossa identidade. Temos contato com certa moral, e a partir dela, achamos que criamos a nossa própria. Da mesma maneira acontece com a ética, opiniões, e até mesmo com gostos que acreditamos ser pessoais.

No entanto, podemos olhar sob a ótica do que a filosofia pós-moderna chama de Sociedade do Controle. Sempre houve vestígios do homem tentando administrar e gerir outros homens, para que, assim, o sistema permanecesse da maneira que sempre foi. E, hoje em dia, esse controle é feito de uma maneira muito mais implícita do que evidente. Não há mais punições em praças públicas e maneiras medievais de repúdio – na verdade até existem, mas houve certo avanço dos direitos humanos para lutar contra. Hoje, existem jogos sociais subliminares, julgamentos, preservação da classe dominante no poder. E isso não é feito apenas pelas instituições, mas também pelos próprios cidadãos que vigiam e assumem o papel de punir (Foucault, 1999).

A questão é que, por causa das características citadas acima, de alguma maneira associamos controle a poder. No sistema, geralmente quem controla exerce algum tipo de poder sobre o controlado. E assim damos vida e voz à nossa área de controle interna, que está associada àquilo que absorve do meio social, como escreveu o filósofo político Noberto Bobbio. Ao viver a ilusão de que podemos controlar todos os aspectos de nossas vidas, temos uma falsa sensação de poder. E, assim como na sociedade do controle que, na maior parte do tempo faz isso de uma maneira sutil, fazemos também conosco. Mecanismos inconscientes da falsa sensação de controle nos atingem a todo tempo. E geram a auto-sabotagem e o sentimento de frustração.

O que não levamos em consideração é que muita coisa simplesmente não está sob o nosso controle. E isso é a ainda mais agravado por uma característica da geração Z, de ter sido criada através do fenômeno do ‘eu sou único e especial’. Isso nos faz acreditar que somos ainda mais responsáveis pelas nossas próprias vidas, sendo que, na verdade, somos apenas vítimas de uma série de consequências do sistema que herdamos.

A verdade é que podemos mudar pouquíssimas coisas dentro da nossa vida, e isso ainda é um privilégio. Quanto mais baixa a classe social, menor a possibilidade de escolha e protagonismo dentro da própria vida.

É muito cruel o discurso do ‘você é responsável pela sua própria vida e por suas próprias conquistas’. Ele justifica uma posição meritocrática, mas não leva em consideração uma sociedade em que as pessoas não tiveram as mesmas oportunidades. Primeiro porque a maioria das pessoas efetivamente não consegue refletir ou efetuar suas escolhas de vida. E, segundo, porque mesmo as poucas pessoas que têm o privilégio de ter essa possibilidade um pouco maior – tiveram acesso à educação, por exemplo, e podem escolher no que se especializar e até mesmo onde trabalhar -, ainda sim não adquirem total responsabilidade sobre os rumos.

Somos aliados do acaso, e isso pode ser bom! Ainda bem que não somos responsáveis por controlar tudo o tempo todo. Paulo Leminiski disse: certezas o tempo leva, só dúvidas ficam de pé.

Giulia Romanelli é publicitária de formação. Leitora e escritora de essência, é atriz amadora, fascinada por reflexões humanas, Filosofia, e pelas relações sociais.