MONÓLOGOS FILOSÓFICOS - Meu aluno: João alguém.

Ontem eu escrevia o texto para o lançamento do meu site oficial e a primeira frase que me ocorreu para iniciá-lo foi ‘Cada um tem seu tempo’. Pensei nela porque eu realmente levei um bom tempo para organizar e publicar minhas ideias e materiais. Mas o que trago hoje aqui não diz respeito a mim ou a minha produção, e sim algo sobre como cada um experimenta a vida de uma forma bem particular e como marcamos pessoas com o que dizemos a elas. O efeito que podemos gerar nos outros já foi muito estudado por psicólogos, sociólogos, filósofos, entretanto, o que me encanta mesmo é a vida prática mostrando como isso acontece.

No mesmo dia em que eu me vi como uma cidadã do meu tempo interno, recebi uma mensagem de um ex-aluno através de uma das minhas redes sociais. Era João, tinha sido meu aluno em 2016. Eu não lembrava dele, sei que era de 2016 porque ele me disse. Lamentei não lembrar do João, porque durante muito tempo eu me gabei de nunca esquecer um aluno, mas lá se vão 15 anos de magistério e, em parte, acho que me perdoo pelos lapsos de memória.

Depois de dizer o nome, ano e instituição em que nos encontramos eu busquei suas fotos e uma imagem fraca dele me veio à cabeça. Eu segui dizendo que ele era bom, porque não me lembrava de João de forma negativa (a gente não esquece aqueles que aprontam. Não mesmo… rs). Lembrei também que ele era bolsista e que foi meu aluno no primeiro ano do ensino médio.

Ele seguiu escrevendo: ‘Você deu uma atenção para eu ficar até o final do ano e ficou preocupada comigo. Acabei de ver que tinha você no Instagram. Sei que o pessoal lá não tinha muita expectativa sobre mim, mas tinha você e mais alguns que ainda tinham um pouco. Acabei abandonando o ensino médio naquele ano e voltei para a rede pública’. João continuou dizendo que aquela escola, na qual nos conhecemos, não era para ele e que só decidiu fazer as coisas da sua forma… e depois.

Eu tentei ser empática (e sincera). Disse que aquela escola não havia sido boa para mim também, mas uma escola sempre ensina alguma coisa para gente, mesmo que seja o que não queremos para nossa vida. Continuei dizendo que estava muito feliz de vê-lo se encontrando e acrescentei, lembrado a mim mesma: às vezes a gente só precisa de tempo.

Agradeci a ele pela mensagem, agradeci por lembrar de mim e me trazer uma notícia tão regozijante aos olhos de um professor – a aprovação de um aluno seu para uma universidade pública. João havia passado para Geografia e estava ali para me trazer essa boa nova.

Imagem: Pixabay.

Quem sou: Roberta Melo, graduada, especialista e mestre em Filosofia; professora com quase 15 anos de carreira; autora do livro ‘Ressentir ou Afirmar? Perspectivas nietzscheanas sobre a dor’, editora Appris, 2018; autora de verbetes de Filosofia na Enciclopédia virtual ‘knoow.net’; apresentadora de vídeos sobre Filosofia no canal ‘Sopro de Atena’. (https://www.youtube.com/soprodeatena).