EFEITO RP - São as águas de março. Por Bárbara Calixto.

Março, para mim, foi um daqueles meses mais intensos e longos possíveis. Assim como agosto é para algumas pessoas, sabe? 

Eu venho em uma constante tentativa-e-erro (e acerto) de equilibrar mais a minha vida pessoal com a profissional, afinal eu acredito em uma única vida e não na separação entre essas duas esferas. Mas março me pegou de jeito e me desequilibrou. 

Eu comecei o mês perdendo uma das minhas melhores amigas. E quem já perdeu alguém, especialmente alguém com pouco mais de 30 anos, sabe como isso é difícil. Lidar com o luto, com a ausência, com tudo o que você precisa ser sem conseguir fazer e existir para nada. O tempo dilata, como se houvesse um outro relógio no mundo, como se as coisas andassem e acontecessem em uma outra dimensão.

Mas ao mesmo tempo, a produção, o ritmo do trabalho, as entregas, os projetos, os boletos, tudo continua. Eu senti e sinto exatamente como a Chimamanda descreveu no seu livro “Notas sobre luto”: “Como é possível o mundo seguir adiante, inspirar e expirar de modo idêntico, enquanto dentro da minha alma tudo se desintegrou de forma permanente?”.

Busquei refúgio na terapia, em livros, em seriados, nas músicas e em pessoas. Mas nada encaixou em mim, nada fez sentido e a sensação de dor e tristeza, a apatia, me acompanharam durante o mês. Oscilando entre “eu não consigo entregar nada porque eu não tenho nada para entregar” e “eu preciso produzir porque eu me comprometi em fazer essas entregas”.

Convenhamos que não existe uma regra para como acolher e lidar com o luto… e também não tem uma forma de como as empresas podem proporcionar um espaço melhor para o colaborador passar por esse momento. Mesmo que seja tirar alguns dias de folga (dois, três, cinco, sei lá quantos, conforme está previsto em lei a depender do grau de parentesco), ainda assim é pouco. A urgência entre cuidar do luto e gerar lucro para a empresa é muito estranha. O trabalho parece superficial e perde o sentido, mesmo quando se está conduzindo grandes projetos. O luto é etéreo, ele vem, ele vai, ele aparece quando você menos espera e você esquece a continuação da frase bem na metade. Você perde a linha de raciocínio no meio de uma apresentação, você erra números de relatório por não conseguir pensar quanto é 2+2.

No meio disso, desses dilemas e sentimentos, da minha sensação de baixa produtividade, eu fui promovida para o cargo que eu tanto batalhei para conseguir, o de Coordenadora de Marketing. Uma mistura entre muita felicidade e reconhecimento, e pensamentos como: “eu não posso contar para a minha amiga sobre isso”. Lembrei do diálogo que li no livro “Uma rosa só”, de Muriel Barbery, que traduz completamente os meus sentimentos: “O mais duro na verdade, não é ser feliz sem o outro, é mudar, não ser mais aquele que éramos com o outro”.

Às vezes, as coisas acontecem exatamente dessa forma, quando você está distraída ou lidando com outras coisas, outras informações mais urgentes e emergentes. Como pode a gente não conseguir saborear todo o gosto da conquista de uma coisa para a qual se batalhou tanto… ou que a conquista fique ofuscada? Como pode as pessoas exigirem tanto da gente quando nós não conseguimos dar nada?

E, juntando um pouco mais na mistura de sentimentos e emoções, com as águas de março fechando o verão e aprendendo a lidar com todos os imprevistos de um planejamento, encerrei o mês recebendo um feedback construtivo, falando sobre comprometimento e (falta de) comunicação. Obrigada pelo feedback, mas eu não tenho o que entregar, simplesmente por não ter o que entregar e não conseguir comunicar. 

Bárbara Calixto é graduada em Relações Públicas pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e possui MBA em Marketing pela USP/Esalq. Atualmente, desempenha a função de Analista de Marketing em uma Govtech (Portabilis) e já trabalhou em agências de comunicação, no segmento varejista e indústrias. Além disso, é uma pessoa que ama cozinhar, apreciar a natureza e está sempre disponível para uma boa conversa.