Em ano de eleições, eu me recordo de algo que aconteceu em um dia de 2o. turno. Um domingo bastante ensolarado e eu tinha que ir trabalhar. Era o que eu menos gostaria de fazer, mas é a obrigação de ser mesário.
Levantei bem cedo, pois teria um longo dia pela frente. São 179 eleitores na minha Seção, de 8 da manhã até às 17 horas. Bem que poderiam ser 180! Um a mais, um a menos, não faria a menor diferença.
Tomei meu café da manhã com um gostoso pão quentinho recheado com queijo e, alguns minutos depois, saí para cumprir a minha obrigação. Não pude nem almoçar com a família, justo no dia do aniversário de um de meus filhos. Caminhei cerca de 15 minutos até chegar à escola. Meu corpo pedia uma boa cadeira à beira da piscina de casa “ao cheiro” do churrasco de aniversário…
Cheguei à escola; nem parecia dia de eleição. Coisa bem estranha…ou não! Foi um dia sem maiores problemas, segundo o Tribunal; sem campanha política. Ainda bem que não houve crime eleitoral na escola onde sou mesário.
O 1o. turno foi uma bagunça! Boca de urna acaba com a imagem da cidade no dia mais importante para eleger nossos governantes. As ruas e avenidas ficam imundas. O papel, que pode ser reciclado, é jogado não só pelos falsos marqueteiros dos políticos, mas também pelos eleitores nas calçadas das ruas. E nós ainda somos obrigados a ver aquela quantidade enorme de promessas políticas junto das caras e bocas dos candidatos.
Onde está a educação das pessoas para não jogar lixo na lixeira? A bagunça começa na mente, pula para dentro de casa e vai parar na rua. Então, parto do princípio: o seu direito começa onde termina o do outro.
Para muitos, votar é chato, para outros, uma responsabilidade. É o voto que vai propiciar a mudança do cenário político de qualquer nação.
Oito horas da manhã, horário de Brasília e a Seção foi aberta. Comecei a pensar nas quase duas centenas de pessoas que fazem parte da Seção onde sou mesário. Será que todas elas sabem exatamente o que estão depositando na urna? Tudo é válido, e o voto é secreto.
As horas foram passando, passando e, poucos minutos antes de eu sair para o almoço, eis que me surge no local, uma senhora nova, bonita, com um garotinho que parecia ser seu filho. O menino tinha jeito de ser muito esperto. Eles cumprimentaram a mim e aos outros colegas da mesa e foram para a cabine. Pensei: menino educado. No pouco tempo em que ficaram na cabine, escutei um cochicho, porém não entendi a voz baixa da jovem senhora. E, em seguida, foi a voz alta do garotinho que fez eco na seção.
— É tinta e quato, mãe!
Fiquei sem entender.
Os meus colegas fingiram que nada acontecera e prenderam o riso. Escutei o sinal de “confirma” da urna e, quando os dois saíram, a senhora estava mais vermelha que pimentão maduro.
Entreguei-lhe o comprovante. O menino mais uma vez foi educado, despediu-se e eles se retiraram da seção. Menos um na fila, pensei…
A sala ficou vazia de novo e os meus colegas caíram na gargalhada e eu, sem entender o porquê, perguntei:
— Ei, qual foi a piada?
Um deles me respondeu com uma pergunta:
— Ouviu o que o menino disse? “É tinta e quato, mãe!”?
— E daí, o que é isso?
— A mãe não lembrava o número do candidato no qual iria votar.
— Hã?
— Preste atenção, Leopoldo! Este menino deve ter uns 5 ou 6 anos, no máximo, e ele respondeu a seguinte pergunta da mãe: “Qual é o número de Élcio Marques?”.
— É sério isso?
— Entendeu agora? Como ele não deve conseguir pronunciar nem tri e nem o tro, ele disse: “é tinta e quato, mãe”, entendeu?
Não tive como não cair na gargalhada, mesmo que atrasada por não haver entendido a piada no mesmo momento que meus colegas.
Até hoje ainda me lembro daquela imagem da linda e jovem senhora, como se fosse um pimentão vermelho dentro da seção. Por volta das 19 horas daquele dia, o candidato, “tinta e quato” do garotinho conseguira se eleger pelos 4 anos seguintes.
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Imagem: Print de Tela.
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Juliana Fernandes Gontijo é jornalista por formação e atriz. Uma redatora apaixonada pela escrita criativa, cultura de maneira geral, que ama escrever, contar histórias reais ou fictícias.