O jeitinho brasileiro na Copa do Mundo. Por Varda Kendler.

“Eu não consigo acreditar no que vejo. Nunca vi tanta dança. É como assistir Dança dos Famosos! Eu sei que tem o ponto da cultura, mas acho realmente desrespeitoso com o adversário. São quatro (gols) e eles fazem toda vez. A primeira dancinha, ou seja lá o que façam, tudo bem. E então o técnico se envolve. Não fico feliz com isso. Não acho isso nada bom”.

Este foi o depoimento do ex-jogador e comentarista irlandês Roy Keane, em uma emissora de TV britânica, no dia 5 de dezembro, considerando algo “desrespeitoso” as danças que jogadores brasileiros fizeram após os gols contra o time sul-coreano na Copa do Mundo de 2022.

Se eu pudesse prosear com este senhor, iria relembrá-lo sobre os traços da nossa cultura, que ele diz saber. Mesmo vivendo em um país com 33 milhões de brasileiros em extrema pobreza, corrupção descarada no alto escalão da nossa esfera política e demais instâncias, falta de investimento em áreas sociais e mais uma lista de injustiças que não irei relatar nesse artigo, somos um povo divertido e cativante.

Mr. Keane, temos alegria, humor e festejos. Temos ginga e sensualidade – desculpe aí! – é a nossa essência. Nosso povo curte dança e música; curte samba, pagode e funk. Conhece? Deveria.

As “dancinhas” são um símbolo da nossa cultura, do nosso DNA. Estamos apenas comemorando nossos gols, momentos especiais, oportunidades raras de celebrarmos o povo valioso que somos. Não fazemos isto para desrespeitar o nosso competidor, mas para fortalecer o nosso orgulho, celebrarmos enquanto nação; fato que tem sido bem difícil por aqui.

Deixa eu te contar, Mr. Keane: fomos colonizados por seus comparsas europeus, mas não se esqueça: também temos nossa ancestralidade africana. Somos um dos povos mais multiétnicos do mundo. Diversidade você encontrará aqui em abundância. Aproveito para esclarecer que temos diversidade, mas não temos representatividade de grupos minorizados, a exemplo da maioria dos países. Isto é assunto para outro artigo.

Permita-me lembrar de temas relevantes que deveriam ocupar bem mais espaço na imprensa internacional: o racismo sofrido por muitos atletas pretos; a xenofobia a imigrantes no país sede da Copa, sejam trabalhadores ou visitantes; a homofobia às pessoas do grupo LGBTQIAPN+; a discriminação e violência contra as mulheres; a desigualdade social… Isto, sim!, é bastante desrespeitoso. Sorry, é inaceitável!

E lamento lhe dizer que um dos nossos craques declarou publicamente que a nossa Seleção Canarinho tem cerca de dez coreografias ensaiadas para cada gol marcado. Convidamos você, os catarianos e outros povos a dançarem conosco e conhecerem melhor o nosso jeitinho. Não irá se arrepender, I promise!

Varda Kendler é mestre em Administração, com formação em Publicidade e Propaganda, e especialização em Marketing, Comunicação Empresarial e Gestão Estratégica da Informação. Tem experiência em empresas de grande porte em gestão da comunicação integrada, cultura organizacional e marketing. Atua como educadora, consultora e empreendedora. É engajada em projetos sociais e faz parte do time do TEDxBelohorizonte.