Comunicação voz-a-voz assíncrona: o fim da linha. Por Manoel Marcondes Machado Neto.

Ivan Illitch, em seu livro “Convivencialidade”, fez reflexões que marcaram a minha graduação. Uma delas tratava da ferramenta “telefone”. Ensinava o autor – mais ou menos isto: o telefone é uma ferramenta convivencial quando você, que visita sua mãe semanalmente, ao se ver impedido de ir numa dada semana, telefona para ela a fim de saber se está bem; mas, o mesmo telefone, pode tornar-se uma ferramenta não-convivencial se você, ao invés de ir visitar sua mãe, passa a, somente, ligar para ela a fim de saber se ela vai bem.

É sutil e parece algo bobo… mas… acompanhe comigo essa história de apenas 22 anos:

Era o ano de 2001 e eu atuava profissionalmente na Accenture, uma das mais valiosas marcas da indústria de tecnologia e serviços. Tínhamos, nos escritórios, um sistema chamado OCTEL. Embutido na central telefônica, ele permitia todo o serviço de chamadas – internas, nacionais e internacionais – de cada mesa, de cada baia, de cada sala – sem qualquer interferência e de modo muito amigável. Qualquer criança se daria com o OCTEL tão bem como se dá com a Alexa.

Mas… havia um “pegadinha esperta” no sistema. Eu podia ligar para a minha chefe (que eu estava avistando, sentada, em sua sala envidraçada), teclar o ramal dela – acrescido de um asterisco – e a ligação, “magicamente”, seria atendida pelo OCTEL, e minha fala, instantaneamente, gravada. Um led vermelho então acendia no aparelho dela (se houvesse outras mensagens ela nem notaria – pois o led já estaria aceso antes da minha chamada), que iria ouvir a minha comunicação (agora mera mensagem de voice mail) quando lhe aprouvesse.

OK – tudo bem… E daí?

Suponhamos que a minha “mensagem” fosse: – Chefe, aquele relatório que era para hoje, vou entregar amanhã… E suponhamos que o tal relatório fosse realmente urgente. Ora, ela não poderia negociar comigo ou repassar a tarefa a outrem, pois ao invés de “ligar” para ela, eu apenas “… deixei uma mensagem no seu OCTEL, chefe!” – a qual teria sido ouvida somente horas depois…

Suponhamos a mesma situação, mas envolvendo um pedido. Minha chefe, precisando muito de um relatório (verdadeiro “pepino”), que só eu poderia entregar, e avistando-me às 17:55 horas ainda em minha baia, ao invés de “ligar” e pedir-me, “… deixa um OCTEL” e sai do escritório imediatamente. Eu, inocente, antes de sair do escritório, resolvo verificar o meu led vermelhinho… e o que encontro? Lá se foi a minha happy hour

Mensageria… golpe de morte nos relacionamentos 

Tal comunicação assíncrona (que me horrorizava) – e nem bem mereceria a alcunha de comunicação -, tomou o mundo de assalto nas redes de mensageria (Messenger, WhatsApp, Telegram) e as nossas relações nunca mais foram as mesmas. Olhe para o seu smartphone e pense a respeito.