Comunicação com beduínos. Por Felipe Lemos.

A força da comunicação estratégica é muito maior do que podemos imaginar. Recentemente, vi um exemplo que me chamou muito a atenção. Uma cidade turística da Jordânia, chamada Petra, ilustra perfeitamente como a comunicação de marcas pode transpor barreiras culturais e diferenças étnicas. Especialmente na relação com os beduínos locais.

Petra é uma cidade histórica construída provavelmente em cerca de 312 a.C., no sul da Jordânia. É famosa por sua arquitetura esculpida em rocha. No local, permanecem ainda partes de templos e palácios que muito provavelmente fizeram parte da antiga suntuosa capital de um império dos árabes nabateus. Nas grutas ou cavernas que compõem a paisagem impressionante, vivem beduínos com suas cabras, ovelhas, camelos e mulas.

Um lugar incrível para se conhecer, sem dúvida. O mais impressionante é que, no caminho que milhares de turistas fazem todos os anos – entre os paredões de pedra – há a presença da venda e do consumo, por parte dos beduínos, de refrigerantes produzidos por multinacionais, sorvetes, produtos industrializados em geral, além de conexão por wi-fi oferecida por uma marca muito forte. E tudo isso em meio a costumes locais apresentados para maravilhar os estrangeiros que por ali aparecem.

Está tudo misturado. Vemos, de um lado, um pouco da história antiga, das roupas, eventualmente de uma ou outra comida, das típicas explicações turísticas. Por outro lado, convivendo junto, vemos o consumo impulsionado pela presença de marcas oriundas do universo ocidental.

O que dá para aprender?

Para a comunicação estratégica de qualquer organização, duas lições podem ser aprendidas. E já enfatizo que este artigo não vai tratar dos efeitos colaterais negativos deste consumismo levado a uma localidade com hábitos anteriormente mais simples e menos ocidentalizados. Essa é uma outra discussão que pode ser feita em outro momento, por outros especialistas.

Duas ideias positivas comunicacionais podem ser aprendidas.

1. De alguma forma, as marcas e seus interesses estratégicos foram absorvidos pela cultura local – não sei exatamente como isso se deu, mas provavelmente a necessidade de sobrevivência de beduínos e a influência positiva que estas marcas e suas estratégias conseguiram exercer na região foram determinantes para permitir a inserção em uma cultura caracterizada por religiosidade forte e hábitos de vida extremamente simples cultivados ao longo de milhares de anos.

Constatei que, em Petra, as marcas coexistem com o estilo de vida dos beduínos locais. Eles, os nativos locais, ainda fazem muito do que seus ancestrais faziam. E pensam da mesma forma em termos de religiosidade. Mas isso agora ocorre com um celular na mão e uma alimentação diferente. Nem tudo talvez seja o melhor para a saúde. Mas é inegável que pode haver uma conciliação entre os princípios já desenvolvidos por eles há séculos e as novidades que chegaram de outra realidade histórica. Há espaço para conciliar novos objetivos comunicacionais e conceitos que não se alteram.

2. A comunicação estratégica não descaracteriza ou elimina o que já se sabe, já se aprendeu ou já se conhece de uma cultura. Entenda cultura como saber e não como um tipo de povo ou etnia apenas. A comunicação que uma organização faz não deve descaracterizar o que determinado grupo para o qual ela fala sabe, conhece ou aprendeu. O que quer dizer isso? O novo saber oferecido pela comunicação estratégica de uma determinada organização (novas tecnologias digitais, por exemplo) não precisa destruir totalmente o que os públicos de interesse de sua mensagem já tinha em termos de conhecimento. Isso se vê em Petra. As marcas estão ali, com seus novos produtos, mas as mercadorias típicas também permanecem com igual importância.

É fundamental entender que todos possuem algum saber. O que a comunicação realiza, quando se mostra estratégica, é a ampliação, a contextualização para que mesmo públicos resistentes culturalmente consigam compreender a importância da mensagem. Vale para Petra, vale para novas ideias comunicacionais em um ambiente de trabalho corporativo, para a igreja local etc.

E pode ser uma boa reflexão para todos nós!

Felipe Lemos é jornalista, mestre na linha de Comunicação das Organizações e gerente da Assessoria de Comunicação da Igreja Adventista do Sétimo Dia na América do Sul.