O OUTRO LADO DAS MARCAS - O desenho como comunicação no processo de 'design'.

Chama-se de processo de design o intervalo entre a ideia e o projeto definido para ser produzido. Visto de fora, parece tudo muito fácil e rápido, mas de fato é trabalhoso e oneroso. No que tange à produção de produtos, um simples erro pode causar um grande prejuízo. Por esse motivo, o trabalho deve ser feito em etapas, para minimizar erros e evitar desperdícios. Os designers têm sido reconhecidos cada vez mais como profissionais-chave nesse processo, pois são capazes de tangibilizar ideias e, para isso, costumam usar o desenho como ferramenta de comunicação. Assim, este texto é dedicado a explicar as especificidades do desenho para cada etapa no percurso do projeto.

A criação é uma construção e não começa de uma folha em branco, mas a partir de uma série de pesquisas que auxiliarão o processo de design. Nesse sentido, é importante que o profissional encontre uma forma de tangibilizar suas ideias, evidenciando o conceito. O mais comum é ‘rafear’, que significa fazer ‘rafes’ (um aportuguesamento da palavra da língua inglesa rough), mais conhecidos por esboços ou croquis. Estes desenhos preliminares têm por característica o pouco detalhamento e servem como recurso para dar vida às primeiras ideias, podendo ser feitos rapidamente em reuniões.

Caso estes desenhos venham a evoluir para um produto, qualquer que seja, é preciso fornecer mais informações em uma segunda oportunidade. No entanto, já não cabe mais um desenho vago como os rabiscos iniciais. Neste momento do projeto, para apresentar a ideia, é preciso fazer um desenho mais acabado, muitas vezes em perspectiva ou dando ideia de volume e textura, recursos que dão vida e facilitam a comunicação. Vale a pena acrescentar que cada vez mais designers têm optado por ‘desenhar direto’ no computador, pois estes oferecem uma miríade de recursos que agilizam o serviço, como a facilidade de apagar uma parte sem ter que reiniciar todo o processo e trocar as cores dos produtos para testar possibilidades e combinações, por exemplo. De modo geral, há cada vez mais ferramentas para representar os materiais de forma a facilitar uma visualização realista do produto. Tenha-se presente que os pacotes de software simulam lápis de cor, marcadores, guache, aerógrafo e aquarela, permitindo ao designer explorar uma série de linguagens de representação. Em suma, estes desenhos devem mostrar características dos materiais, como texturas, transparências, brilhos etc. Atualmente, com o desenvolvimento da tecnologia 3D, é possível optar por esculpir o produto em um espaço virtual. Isso permite virar o produto para vê-lo de outros ângulos e simular luzes e sombras para ressaltar volumes e texturas.

Para produzir, de verdade, um artefato, é necessário fazê-lo a partir da criação de modelos tridimensionais palpáveis (peças-piloto) ou virtuais. Neste momento, destaca-se outro tipo de desenho destinado para a produção: o desenho técnico. É uma forma prática de aferir as medidas (cotas), uma vez que o produto é representado por meio de vistas: de frente, de cima, de baixo e de lado. É um desenho linear em preto e branco e, em virtude destas observações, entende-se que não é um desenho que favoreça a visualização do produto como um todo. Uma das principais qualidades do desenho técnico é a precisão e, por este motivo, não pode ser feito em perspectiva. Destaca-se seu uso na conferência das medidas após o produto pronto, para verificar se o mesmo obedece aos parâmetros estabelecidos pelo controle de qualidade (infelizmente não é uma prática geral). Convém ressaltar que os desenhos técnicos devem esclarecer quaisquer dúvidas, pois nem sempre o designer estará ao lado de sua criação. Até porque muitas vezes ela é feita no escritório e a produção em uma fábrica ou confecção.

Na pesquisa de campo que realizei para compor minha tese de doutorado, percebi algumas especificidades no design de moda. Usa-se o termo croquis tanto para um rabisco inicial – para definir a silhueta geral e as proporções –, como para definir a aparência final de uma peça de roupa. O croquis arte-finalizado de um produto de moda pode tanto ser a representação de uma peça de roupa vestindo um modelo ou a peça somente. Cabe reiterar que, na prática, estes croquis são suprimidos por conta da agilidade do processo de produção. Em seu lugar há um ‘croquis técnico’. Basicamente é um desenho técnico proporcional, representado pela vista de frente e de costas, sem tanta precisão de medidas.

Então, uma vez criado o produto, é preciso mostrar suas potencialidades. Uma fotografia costuma cumprir este objetivo, mas muitas vezes são usados desenhos para ilustrar manuais de montagem, pois são feitos com poucas linhas e evidenciam apenas o que é necessário. É de verificar que nem sempre o designer assume este trabalho, pois o processo de criação terminou quando o produto foi enviado para a produção, ficando por conta de um ilustrador profissional. Porém, com o auxílio de software, cada vez mais o designer tem tido controle e consegue extrair, por exemplo, uma ‘vista explodida’ de um produto, habitual em manuais de instalação. Cumpre assinalar que os desenhos desta etapa também são usados para acompanhar os pedidos de patentes.

Entender o outro lado das marcas é importante para valorizar o trabalho dos profissionais que estão nos bastidores e para mostrar o desenho como ferramenta de comunicação no processo de design.

Referências

CABRERA, Alfredo; FREDERICK, Matthew. 101 Things I learned in Fashion School. New York: Hachette Book Group, 2010.
PIPES, Alan. Desenho para designers: habilidades de desenho, esboços de conceito, design auxiliado por computador, ilustração, ferramentas e materiais, apresentações, técnicas de pro­dução. São Paulo: Edgard Blüscher, 2010.
MONTEIRO, Gisela Costa Pinheiro. O designer como o responsável por preservar a identidade da marca ao longo da produção das coleções de moda. 2018. 445 p. Tese (Doutorado em Design) – Escola Superior de Desenho Industrial, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018.
STRAUB et al. ABC do Rendering. Curitiba: Infolio, 2004.

Gisela Pinheiro Monteiro é mestre e doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Design da ESDI/UERJ, na linha de pesquisa ‘História do Design Brasileiro’. É também graduada pela mesma instituição com habilitação em ‘Projeto de Produto e Programação Visual’. Possui formação técnica em Design Gráfico pelo Senai Artes Gráficas do Rio de Janeiro e experiência na prática do Design, tendo sido responsável por diversos projetos para empresas. Atua como docente em diversas instituições do Rio de Janeiro.