O OUTRO LADO DAS MARCAS - Atenção às etiquetas: elas revelam a alma dos produtos.

Elas coçam, arranham, irritam e costumam ser cortadas das roupas. Nem é preciso falar mais para saber o meu tema: etiquetas – aquelas com informações de composição e de uso. Embora indesejadas, carregam dados importantes, principalmente na hora de passar a peça adiante – algo cada vez mais comum com o crescimento do número de brechós.

Para quem não sabe, existe a Lei número 5.966, sobre etiquetagem na área têxtil, que não se restringe ao vestuário, mas se estende à roupa de cama, mesa e banho. Relativamente recente, foi implementada em 1973 para orientar o consumidor sobre o produto que está comprando. Ela determina que seja expresso, por exemplo, se a peça foi feita de algodão ou poliéster. Informações como essa evitam alergias e garantem uma concorrência mais leal entre os fabricantes, além de serem importantes para o ingresso do Brasil no comércio exterior.

Em geral, essas etiquetas são feitas de pequenos pedaços de tecido costurados nas peças. Como muitas pessoas costumam cortá-las, algumas empresas já as projetam com indicação de picote para facilitar sua remoção. No entanto, com isso, se perdem todas as informações exigidas pelo Instituto de Pesos e Medidas (IPEM) como: nome ou razão social do responsável pelo projeto, país de origem, composição, tratamento e cuidado para a conservação e tamanho da peça.

O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) informa que, ao fazer isso, o usuário perde o direito de reclamar se a roupa encolher ou manchar, pois descartou informações sobre a maneira correta de lavar, secar e passar ao retirar a etiqueta.

A etiqueta também pode ser útil para preservar o ambiente, orientando, por exemplo, como lavar a roupa com economia de água e energia, tal como fez a marca de jeans Levi’s, que pesquisou o ciclo de vida de seu clássico modelo 501 e elaborou uma sugestão de lavagem mais econômica da peça, já que ‘60% do total de emissões de dióxido de carbono (32,3 kg) são atribuídos a lavagem/cuidados do consumidor’ (FLETCHER, 2011, p. 61). No mesmo caminho, a empresa inglesa Marks & Spencer usou a etiqueta como bandeira para divulgar seu slogan ‘Pense no ambiente, lave a 30°C’, procurando evitar o gasto energético excessivo.

Vale refletir que, embora haja controvérsias sobre a eficácia dos detergentes em temperaturas mais baixas, países mais conscientes feito o Japão adotaram lavar suas peças em temperatura ambiente (idem).

Infelizmente, nem todas as etiquetas sobrevivem às sucessivas lavagens. Basta abrirmos nossos armários e vermos que muitas etiquetas se degradam de tal forma que não é possível mais ler suas informações. Isso representa um prejuízo a seu caráter primeiro, que é o da comunicação. Aliás, este é outro assunto que merece umas linhas. Para caber tanta informação em um espaço tão exíguo, é comum o uso de símbolos: um baldinho (indica que a peça pode ser lavada e a qual temperatura), um triângulo (se pode ou não ter alvejamento), uma quadrado (se permite secagem), um ferro (se pode passar e a que temperatura) e um círculo (se requer cuidado têxtil profissional).

Por sua simplicidade, os símbolos suportam redução o suficiente para serem lidos no espaço de uma etiqueta. Mas, com exceção do baldinho e do ferro, não é intuitivo associar um triângulo ao alvejamento e um quadrado a secagem, por exemplo. Talvez esse seja mais um motivo para que as pessoas não pensem duas vezes antes de retirar as etiquetas.

É bem verdade que o tamanho diminuto das etiquetas já não tem sido mais um entrave, após a criação das etiquetas com QR Code. Basta apontar o celular para o código na peça para ter acesso a informações detalhadas sobre o produto. Atualmente há uma série de empresas fazem uso desse recurso.

Vale lembrar também a vantagem das etiquetas estampadas diretamente no interior dos produtos: uma solução criativa que serve tanto para aumentar o tamanho das etiquetas, bem como evitar seu incômodo. São muito comuns em T-shirts e roupas para a prática de esporte. Porém, esta solução não pode ser generalizada, pois a informação pode sumir em meio a um tecido muito estampado ou com a superfície muito irregular. Para isso, é preciso que um designer esteja atento para escolher a solução para dispor as informações do produto de maneira adequada.

Enfim, após o que foi exposto, fica claro que as etiquetas devem ser um item importante nas tarefas do designer. As empresas que cuidam da maneira como informam os clientes sobre seus produtos merecem ser parabenizadas, pois estão investindo na transparência da informação, cada vez mais exigida e valorizada pelas pessoas.

Referências

FLETCHER, Kate. Moda & sustentabilidade: design para mudança. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2011.
MONTEIRO, Gisela Costa Pinheiro. O designer como o responsável por preservar a identidade da marca ao longo da produção das coleções de moda. 2018. 445 p. Tese (Doutorado em Design) – Escola Superior de Desenho Industrial, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018.

Gisela Pinheiro Monteiro é mestre e doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Design da ESDI/UERJ, na linha de pesquisa ‘História do Design Brasileiro’. É também graduada pela mesma instituição com habilitação em ‘Projeto de Produto e Programação Visual’. Possui formação técnica em Design Gráfico pelo Senai Artes Gráficas do Rio de Janeiro e experiência na prática do Design, tendo sido responsável por diversos projetos para empresas. Atua como docente em diversas instituições do Rio de Janeiro.