No debate americano, só faltou um candidato pular no pescoço do outro. Nos debates brasileiros, houve mais educação, mais civilidade, apesar do gigantesco número de debatedores. Mas o resultado de ambos foi igual: em todos os casos, não houve um vitorioso no debate.
Quem apoiava Joe Biden acha que ele venceu; quem apoiava Trump o viu como claro vencedor. O que se pode imaginar é que, como os pesquisados apontam como vitorioso o seu preferido, Joe Biden leva alguma vantagem no número de votos – algo como 10%. Isso não quer dizer que esteja ganhando as eleições: o pleito americano é decidido Estado por Estado, e o número de delegados eleitorais, decisivo, é dificílimo de calcular. Apenas como exemplo, Hillary venceu Trump no número de votos, e foi derrotada na contagem dos delegados eleitorais.
O sistema brasileiro é mais simples, um eleitor, um voto. Mas é muito cedo ainda para prever o vitorioso. Primeiro, faltam os outros debates. Falta a tomada de posição de alguns eleitores importantes – Bolsonaro, por exemplo. Martha Suplicy, dizem, deve dar apoio a Bruno Covas. Martha Suplicy criou o Bilhete Único de transporte e investiu pesadamente em CEUs, excelentes escolas gratuitas de período integral. Falta que o candidato preferido de Martha saiba divulgar esse apoio, falta esperar eventos que influenciem o resultado. Erundina era terceira e em três dias virou o jogo, derrotando o favorito Maluf. Erundina, agora, é vice de Boulos.
Lembrando a História
No final de seus discursos, Bolsonaro diz que prefere os candidatos que se comprometam com o lema Deus, Pátria, Família. É o lema da Ação Integralista Brasileira, cópia do fascismo italiano. O dirigente máximo da Ação Integralista Brasileira, Plínio Salgado, tentou um golpe contra Getúlio Vargas, até então seu aliado. E poucos anos depois o Brasil enviou tropas à Itália, comandadas pelo marechal Mascarenhas de Moraes, para lutar contra o fascismo, inspirador do integralismo.
Ou Bolsonaro não sabe o que está falando, e isso é péssimo, ou sabe, e é pior ainda.
Os problemas argentinos
Tenho uma opinião firmada sobre os problemas argentinos: um dos países mais ricos do mundo, com analfabetismo próximo de zero, autossuficiente em carne, trigo e petróleo, não resistiu à devastação peronista. Pior: a coisa foi tão longe que há peronistas de esquerda, de direita, extremistas. É normal que as eleições envolvam disputas entre peronistas de um lado e de outro. Já vi eleições em que o hino peronista de direita louvava a segunda mulher de Perón (‘Perón, Isabelita, la Patria peronista’); o peronismo de esquerda era favorável à primeira mulher de Perón, (‘Perón, Evita, la Patria socialista’). E Cristina Kirchner dificilmente poderia ser pior do que já é. Bom, mas isso não significa que sejam verdadeiras as notícias sobre a vida na Argentina. A informação de que a pobreza atinge 40,9% da população argentina é falha. Pobreza, lá, significa receber menos de 45 mil pesos mensais – R$ 3.300,00. E indigente é quem ganha abaixo de 18.500 pesos, R$ 1.370,00.
Estão mal, mas há pelo menos um país vizinho que está bem pior.
O custo de vida
A empregada doméstica de um executivo de empresa multinacional ganha 20 mil pesos mensais, trabalhando seis horas por dia. Cabe ao patrão pagar condução, almoço e o metade do seguro-saúde (dois mil pesos) que garante a ela e aos filhos o atendimento hospitalar – que ele prefere pagar integralmente. Os três filhos estudam em boas escolas públicas, a filha faz Direito na Universidade de Buenos Aires, e ela se queixa, dizendo que a Argentina é um desastre. Quanto à situação do Brasil, ela simplesmente não acredita no que lhe contam.
Mudando a Coca-Cola
A informação de que a Coca-Cola está deixando a Argentina também não é bem assim. O que sai da Argentina (com destino ao Rio) é o escritório regional da América Latina. As fábricas continuam produzindo onde estão.
Super liberal
Tanto o presidente Bolsonaro quando seu superministro da Economia, o Imposto Ipiranga, cansaram de dizer que os preços são determinados pela lei da oferta e da procura. Cansaram de dizer – e o Procon de São Paulo não concordou. Já notificou quase 600 estabelecimentos no Estado, ‘na operação de enfrentamento ao aumento injustificado de preços de alimentos’. O Procon exige que as lojas apresentem notas fiscais de compra e venda de itens da cesta básica, para verificar ‘eventual prática de preços abusivos’.
Pois é: no Governo Sarney, o secretário da Receita Federal, xerife Romeu Tuma, foi aos pastos intimar os bois a se apresentar dentro de normas dos preços congelados. Não resolveu nada. O Plano Real, sem congelamento, sem ‘teje preso’ no pasto, derrubou a inflação. E justo um ministro que se considera liberal, e que sabe perfeitamente que não adianta tabelar preços, aceita de bom grado trabalhar com órgãos estatais que querem controlar preços.