Os profissionais de comunicação desempenham atividade crucial na construção da imagem e da reputação das organizações, produtos, serviços e pessoas físicas, incluindo celebridades, autoridades e até mesmo influencers.
É uma relação que precisa ser talhada em alianças de muita confiança e responsabilidade, nas quais o uso de uma via de mão dupla seja eloquente e possibilite uma formatação de táticas estratégicas com total comprometimento e ética, sobretudo aos valores pregados e respeito aos grupos de interesse que serão impactados por tal plano.
Mas… cada vez mais, me pergunto em que cartilha, pseudo-profissionais de comunicação aprenderam seu ofício, pois não há como creditar uma formação com tamanha labilidade de honestidade e compromisso com a verdade.
A comunicação não pode jamais compactuar com mentiras, enganações e manobras produzidas para surtir efeito, que não têm como base o senso de veracidade.
Não é à toa, que em pleno século XXI, estamos todos preocupados e agindo para que as fake news ou pós-verdades não ganhem propulsão em escala, prejudicando todos e tudo na ambiência social.
O mais recente caso que me fez refletir sobre isso está atrelado a uma personalidade que, absurdamente, tem ganhado espaço como um “talento” do cenário musical brasileiro. Desculpem… tive que colocar entre aspas a palavra talento pois não consigo associar tamanha habilidade a esse ser em questão!
Oruam, 23 anos, cujo nome verdadeiro é Mauro Davi dos Santos Nepomuceno, tem se destacado no mercado do rap nacional. Seu nome artístico é um anagrama de seu próprio nome, escrito ao contrário. O cantor é dono do hit “Oh Garota Eu Quero Você Só Pra Mim”. Apesar do sucesso meteórico, Oruam teve o nome envolvido em discussões políticas recentemente, com projetos de lei para impedir a contratação de artistas e eventos que possam, supostamente, promover apologia ao crime.
Tais projetos, que estão sendo debatidos em diversas partes do país, contabilizando mais de 80 cidades brasileiras, sendo 18 capitais, pretendem proibir apresentações artísticas e culturais que enalteçam o crime organizado e o tráfico de drogas em eventos financiados com recursos públicos.
No município de Maceió, por exemplo, denominada Lei Anti-Oruam, a proposta visa assegurar que o dinheiro público seja investido de forma responsável e alinhada com as políticas de segurança e ordem social. “Não podemos permitir que, enquanto combatemos o crime organizado nas ruas, o poder público financie artistas que enaltecem essa realidade. Essa contradição precisa acabar”, destacou Thiago Prado, autoridade local.
Mas além de toda essa repercussão relacionada ao seu nome – e que vejo até mesmo com bons olhos -, há muita lógica em sua argumentação.
Outro ponto que me chamou a atenção relacionado ao nome desse rapaz, ocorreu justamente envolvendo questões de segurança: Oruam foi detido após ser abordado em uma blitz, no Rio de Janeiro, após dar um “cavalo-de-pau” na frente de um carro da PM e parar virado para a contramão. Além disso, ele ainda dirigia com a carteira de motorista suspensa.
A figura foi encaminhada à 16a. Delegacia de Polícia Civil, na Barra da Tijuca (RJ), onde foi autuada em flagrante por direção perigosa e posteriormente foi arbitrada fiança de R$ 60.720,00 – o equivalente a 40 salários-mínimos.
Porém, uma mera casualidade, que eu não acredito ocorreu, no dia seguinte: o lançamento do seu primeiro álbum de estúdio pelo selo Mainstreet Records, chamado “LIBERDADE”. Nas fotos de divulgação, publicadas por Oruam nas redes sociais, o rapper aparece dentro de um carro da polícia, algemado. As imagens ainda mostram fãs com cartazes pedindo sua liberdade. Aliás, foi parte da equipe de comunicação dele que teria registrado a ação.
Autoridades consideram que o rapaz realizou o crime propositalmente visando chamar atenção para si, numa “estratégia de marketing”. Uma produção que colaborou para deixar Oruam em evidência.
Mas como pessoas ligadas a comunicação podem ser cúmplices dessas armações tão descaradas?
Onde está o código de ética desse mercado? As relações públicas por intermédio de seus conselhos, já que se trata de uma profissão regulamentada, até o têm… mas como é que ocorre a fiscalização? Como é avaliação?
Ao permitir que qualquer pessoa, sem instrução formativa, atue na área – o que mais temos acompanhado -, são ações esdrúxulas que corrompem o perfil sério de profissionais que não se vergam por dinheiro ou fama.
É preciso dar um basta nisso, caso contrário, a comunicação se tornará instrumento letal nas mãos de levianos.
Há ainda um detalhe: Oruam é filho do traficante Marcinho VP, que cumpre pena em prisão desde 1996. Em março do ano passado, após realizar um show no festival Loolapalooza, em São Paulo, ele subiu ao palco com uma camiseta pedindo pela liberdade da figura paterna. Em sua relação parental criminosa, há ainda o nome do traficante carioca: Elias Maluco, assassino do jornalista Tim Lopes. Considerado tio do músico, Elias foi homenageado pelo sobrinho com uma tatuagem na barriga.
É, ele realmente é uma personalidade cheia de contatos, digamos, nada edificantes, e quem está ao seu redor, sem dúvida alguma, compactua com seu estilo e posicionamento. Em uma única rede social, Oruam tem oito milhões de seguidores.
A comunicação é para todos, ela é democrática, mas não deve ser usada como elemento de manipulação e mentiroso. Há inúmeras ocorrências no mundo todo em que presenciamos essa prática e os resultados foram sempre os piores possíveis.
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Andrea Nakane é bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Relações Públicas. Possui especialização em Marketing (ESPM-Rio), em Educação do Ensino Superior (Universidade Anhembi-Morumbi), em Administração e Organização de Eventos (Senac-SP), e Planejamento, Implementação e Gestão da Educação a Distância (UFF). É mestre Hospitalidade pela Universidade Anhembi-Morumbi e doutora em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo, com tese focada no ambiente dos eventos de entretenimento ao vivo, construção e gestão de marcas. Registro profissional 3260 / Conrerp2 – São Paulo e Paraná.