NOVA COLUNISTA: Victoria Roza Cruz. Somos mais que resultado. Somos processo.

Antes de escrever sobre qualquer assunto, precisa-se dialogar sobre o processo de escrita.

O que uns chamam de dom, outros de talento, outros de treinamento, eu chamo de processo criativo sensível e profundo.

O humano é um ser social, portanto, com necessidade constante de se comunicar. Levo para a vida a filosofia africana do ‘Ubuntu’, que significa: eu sou porque nós somos. Ou seja, sou o que sou pelos encontros e aprendizados das pessoas que cruzaram minha jornada. Também é um intenso trabalho de se colocar no todo, esvaziar o ego e nutrir a cooperação.

Comunicar é falar com intenção. Na maioria das vezes juramos de pés juntos que somos claros e coerentes ao compartilhar com o outro, contudo, não é bem assim, ainda mais em tempos de mais digitação e menos olho no olho. O desafio é aguçar esse senso de comunidade e provocar empatia através da escrita.

Eu acredito em processo de imersão. Precisamos olhar para dentro. Fundo. O que eu sinto? O que eu percebo? O que quero comunicar? Para quem comunicar? Escrever é transformar incômodos em informação.

Antes de falar em processo criativo, vale lembrar que uma boa escrita é fruto de muita leitura. De diferentes estilos, tamanhos e objetivos. É preciso ler para expandir o vocabulário, para autoconhecimento e enriquecimento de experiências e vivências.

Como jornalista, a escrita está em piloto automático, em que identifico uma notícia e preciso transformá-la em informação rápida e objetiva. Porém, preciso escrevê-la pensando no meu público-alvo. A escolha das palavras deve ser precisa, afinal, imparcialidade é um dos pilares da minha atividade. Tenho de ser cautelosa com os sentimentos que posso provocar em quem está consumindo a notícia. Este tipo de texto é quase técnico, porém, eu também sou humana, portanto, os acontecimentos me tocam de alguma forma e preciso trabalhar internamente para que não influenciem no que é fundamental noticiar.

Esta rotina é bem interessante. Ler e reler os textos, principalmente os mais antigos, é como mergulhar em mil lembranças. Mas, bom mesmo é escrever aquela palpitação, aquela borboleta no estômago, aquela inconformidade, aquela baita reflexão incontrolável que precisa ser compartilhada, aquela necessidade de que… AH, EU PRECISO FALAR!

Escreva. Escrever é empoderar-se. Todos nós temos ótimas ideias e podemos sim proporcionar reflexões coletivas, sejam elas através de textos em que contamos nossas próprias experiências, ou textos informativos, ou mesmo com a elaboração de uma história fictícia.

Ande com um caderninho na bolsa, ou tenha um aplicativo de bloco de notas. Escreva. Escreva o que vier. Deixe o criativo fluir. Depois, organize exercitando a coerência e coesão. É de suma importância que o texto tenha início, meio e fim. Assim, o convite para leitura certamente torna-se um mergulho profundo, que deixará uma semente plantada no subconsciente e se tornará o despertar de algo novo.

Pense que, se Paulo Freire não tivesse experienciado o aprendizado através do processo, eu mesma não ousaria escrever sobre um processo de produção de texto. Freire propõe exatamente isso: que não há um detentor da informação e sabedoria. O conhecimento nasce do processo de troca horizontal entre semelhantes. Ei, você! Você tem voz e sua visão é relevante. Portanto, Ubuntu, meu caro leitor. Não seja um autossabotador. Seja seu maior incentivador. Seja os textos que gostaria de ler. Permita-se inspirar e ser inspirado. Valorize cada palavra e saboreie tudo que elas têm a dizer. Assim nascem as pequenas ideias que reverberam, conectam pessoas, promovem debates intelectuais relevantes e podem até transformar o mundo.

Escrever é transborda-se.

Victoria Roza Cruz, carioca, pós-graduanda em Meio Ambiente pela Coppe/UFRJ, jornalista e locutora na Antena 1 Rio. Idealizadora e apresentadora do programa ‘Impacta Rio’. Acredito na comunicação que move corações e mentes, que é capaz de transformar e empoderar.