Os desafios de atuar profissionalmente com um pé em cada lado do oceano.
Com licença, como é da boa educação se apresentar antes de começar qualquer conversa, tentarei ser breve. Prazer, meu nome é Cristina Rispoli d’Azevedo, jornalista por formação e pau para toda obra por prática laboral. Mais recentemente, descobri uma expressão que tem sido empregada para se referir ao profissional que atua em diferentes áreas simultaneamente: o slashing. Refere-se a indivíduos que, por combinarem diferentes habilidades e práticas profissionais, não conseguem responder à pergunta “Qual é o teu trabalho?” com uma única palavra ou definição, o que representa também ter fontes de rendimento mais diversificadas. Pois bem, é mais ou menos assim que me identifico há anos.
Com uma trajetória iniciada em redação de jornal diário, desde cedo percebi que era pouco provável permanecer muito tempo em lugares que já tinham fórmulas e regras a serem seguidas ou simplesmente percorrer caminhos já trilhados por outras pessoas. Sempre fui bastante interessada e observadora. Gosto de estar em constante aprendizado e evolução, o que me impede de fazer a mesma coisa, do mesmo jeito, por períodos longos. Olho, aprendo e aprimoro. Se o meio ou as pessoas à minha volta forem propensos a engessar processos ou manter tudo como está, prefiro seguir adiante. Antes, eu era mais de defender minhas ideias e propostas. Hoje, entendo que, melhor do que debater e argumentar, é deixar fluir. Melhor ser feliz do que ter razão, não é mesmo?
Há cerca de sete anos, me vi sentada em meu home office – algo que ainda era visto com bastante desconfiança e resistência por parte de clientes e colegas de profissão – em uma situação já bem estabelecida, com uma carteira de clientes considerável, trabalhando em ritmo quase insano e me perguntei: “E o que mais?”. Quase como aquela cena do filme “O Show de Truman” em que o protagonista, interpretado pelo ator Jim Carrey, alcança o fim do cenário. Não que aquele fosse o limite de onde eu poderia chegar, mas, a partir dali, surgiu em mim um desejo de ir além daquele espaço, explorar novos horizontes ainda desconhecidos. E foi assim que surgiu a ideia de migrar.
A escolha por Portugal não foi difícil de ser tomada. Afinal, é o mesmo idioma e as semelhanças culturais e históricas entre os dois países pareciam ser fatores facilitadores para auxiliar o processo de mudança e adaptação a uma nova realidade, certo? Com disciplina e determinação, poderia manter meus clientes e trabalhos no Brasil e, ao mesmo tempo, desbravar novas aventuras em terras lusitanas. É, dizendo assim, parece fácil. Na prática, porém, os desafios e obstáculos são bem maiores do que os previstos.
O idioma até pode ser o mesmo, mas a linguagem… Foi só ao morar em Portugal que descobri que não falamos português, mas brasileiro. É claro que conseguimos nos entender, mas nem sempre nos comunicamos bem. Como atender ao telefone? Com um “alô” ou um “estou, sim”? E por falar em telefone, é celular ou telemóvel? Devemos entrar em contato ou em contacto com as pessoas? Entende o que eu quero dizer? Ou não estás a perceber?
Além das diferenças linguísticas, viver em dois fusos horários simultaneamente não é tarefa para amadores. Nas reuniões online com o Brasil, o melhor é trocar os tradicionais “bom dia” e “boa tarde” por um simples “oi, tudo bem?”. Sem contar que Portugal, assim como outros países da Europa, adota o horário de verão. Ou seja, a diferença horária em relação ao Brasil não é sempre a mesma ao longo do ano. Quando o Brasil ainda tinha o horário de verão ativo, então, eram quatro alterações de horário por ano. Uma tremenda confusão!
Outra questão que eu, particularmente, só assimilei depois que me mudei de continente é que as pessoas com quem você trabalha, seja online no Brasil, seja presencialmente em Portugal, não fazem ideia de como é a “sua vida” do outro lado do oceano. Ou seja, quem é do Brasil desconhece completamente como é o seu dia a dia em Portugal. Assim como quem é de Portugal não faz ideia de como é o cenário de onde você veio do Brasil. Bem-vindo ao mundo dos seres estranhos que habitam outros países! Além disso, o fato é que a maioria das pessoas pouco ou nada se importa ou se interessa por isso. Aceita logo que dói menos!
Para evitar falar do que mais machuca, nem vamos entrar em questões emocionais, nostálgicas e de saudades intensas dos amigos, familiares e antigos hábitos e costumes. Ah… e vamos também deixar de lado a montanha-russa cambial e o recente reajuste do valor de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) das remessas para o exterior. Afinal, o atual índice de 3,5% é só mais que o triplo de antes, né? Para que tanto drama?
Enfim, como diria Caetano Veloso na música “Dom de iludir”: “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Se fosse fácil, provavelmente não teria a menor graça e, logo, eu já estaria de malas prontas rumo a novos horizontes. Quem sabe em breve! Por enquanto, seguimos batalhando por aqui. E com o maior prazer!
Desde já, agradeço o convite do professor Manoel Marcondes Machado Neto, pós-doutor em Cultura e Territorialidades e cofundador do Observatório da Comunicação Institucional, para integrar a equipe de colaboradores do Portal O.C.I. É uma honra e uma enorme responsabilidade para mim. Espero fazer jus à confiança depositada!
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Cristina Rispoli d’Azevedo é graduada em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e especialista em Gestão Estratégica da Comunicação pelo Instituto Brasileiro de Gestão de Negócios (IBGEN). Apaixonada por contar histórias e leitora voraz, é uma comunicadora empreendedora que atua como assessora de imprensa, produtora de conteúdo, redatora e correspondente em Portugal.