NOVA COLUNA: A TEMPO - Programas de diversidade como recurso de mediação intercultural: conflitos e caminhos na inclusão de negros no mercado de trabalho. Por Tamiris H. Cruz.

A atualidade é marcada por crises e confrontos e, conforme penetramos o século XXI, tornou-se óbvio que nada poderia ser como sempre foi. Vivemos em uma sociedade de contradições e paradoxos, disputas e narrativas, e que ainda não se resolveu com suas fissuras e desigualdades, e essa é parte importante e essencial da análise que proponho aqui, visto que o estudo da interculturalidade deve ser marcado e abordado a partir de uma perspectiva que abranja sua responsabilidade social e histórica, de modo a evitar esvaziamentos e distorções características de uma globalização tecnológica que tem a todos conectados e muitas vezes é responsável por criar mais disparidades e diferenças.

Quando buscamos uma bibliografia adequada para analisarmos as problemáticas relacionadas a interculturalidade na América Latina e no Brasil percebemos a escassez de trabalhos e teóricos na área que trabalhem a partir de uma ótica comunicacional. Por certo, encontramos grandes estudiosos da Antropologia e Sociologia da Cultura que trabalham essas interseccionalidades, como Canclini, por exemplo, mas estudos comunicacionais a partir de uma perspectiva mais funcionalista são raros, fato que sem dúvidas atrasou o desenvolvimento da questão na sociedade brasileira, e latino-americana, apesar de todas as distinções entre esses dois contextos.

De certo, a falta de referencial acadêmico e teórico não é a única razão pelo qual o Brasil demorou a despertar para as questões interculturais e de diversidade. Devemos considerar as questões sócio-históricas e socioeconômicas em que o estado brasileiro foi concebido, da colonização à redemocratização. A história do Brasil com seus percalços e mazelas confluem para uma sociedade relutante em admitir suas disparidades e ressarcir suas dívidas históricas. Por isso, o estudo, o desenvolvimento e a solidificação dessa matéria são pungentes para a realidade brasileira, dado que o estudo da interculturalidade representa comunicar e conectar os diferentes (étnicos, de gênero, de religião), e não há caminho para a justiça social que não passe por esses imperativos.

E em um contexto de descentralização do estado em prol de um modelo econômico liberal, o estado não tem condições ser único e exclusivo formulador, implementador e mediador de ações de equidade. Assim, necessárias ações e comprometimento da iniciativa privada nessa árdua tarefa de amenizar, ressarcir e incluir a maioria minorizada como a população negra e periférica. Não são desconhecidos os benefícios de um ambiente de trabalho diverso, em criatividade, inovação e cultura corporativa, mas esses são os ganhos do processo, e é necessário que esse seja tocado com eficiência e sensibilidade, de forma contínua. Diante do exposto, não é incoerente perguntar se as organizações estão dispostas a dar esse passo, entretanto, esse é o movimento natural posto que observamos um consenso diante necessidade de inclusão e reparação das maiorias minorizadas no mercado de trabalho e em grandes cargos. Isto nos informa que, em um futuro próximo, programas de inclusão e equidade, grupos diversos e interdisciplinares não serão mais diferenciais e sim norma e a pergunta deve ser ainda mais profunda; as organizações estão dispostas a se comprometer com responsabilidade social, histórica e de maneira conciliadora nessas questões tão latentes da sociedade brasileira, ou estarão apenas em busca de um capital social imbricado na “moeda diversidade”?

Tamiris H. Cruz é graduada em Publicidade e Propaganda pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (São Paulo/SP) e pós-graduanda em Gestão de Negócios pela Fundação Dom Cabral. É especialista em Mídia, com atuação em grandes agências de Publicidade (JWT, Ogilvy e Africa).