Em um restaurante sofisticado da cidade, um casal inicia uma discussão.
— Você está me traindo, Alberto!
— Como assim, meu bem?
— Simples assim, me tra-in-do!
— Fale baixo!
— Não estou gritando para o restaurante ouvir.
— Mas eu não fiz nada, Janaína.
— Justo hoje, Beto, no Dia dos Namorados? — Disse ela em tom mais baixo, porém com rispidez.
— O que é isso, Jana?
— Não me venha com mais uma de suas conversas, Beto!
— Santo Deus, como eu gostaria de acreditar que isso fosse mentira ou que eu estivesse sonhando.
— Não envolva Deus nisso, cara!
— Cara? Olha como fala comigo, mocinha!
— Mocinha?
— Sim!
— Está me ameaçando, é, Beto?
— Sem essa, Janaína!
— Isso é uma ameaça, você sabia?
— Ah… me belisca, para ver se estou sonhando!
— Não me venha de novo com desculpas!
— Desculpas?
— A filha da irmã da Maura me falou que…
— Eu não entendi!
— Sim, a filha da irmã da Maura!
— Não, Jana.
— Sim, Beto!
— A vizinha do 302, pelo amor de Deus! Todo mundo sabe que ela fala “pelos cotovelos”.
— Não coloque Deus na parada, eu já falei!
— Mulher futriqueira.
— Cale a boca, Beto!
— Vamos embora, Jana. — Ele faz um sinal com a mão, chamando o garçom, a fim de pedir a conta.
— Eu não vou embora!
— Mas restaurante não é lugar para discussão!
— Não saí do outro lado da cidade para me encontrar com você e ir embora com apenas uma taça de vinho.
— E eu não vim de outra cidade para ficar discutindo num restaurante justo no Dia dos Namorados.
— Mas você está me traindo, Beto!
— Quantas vezes vou ter que te implorar para não acreditar naquela futriqueira da Alaíde?
— Então, quem é Clara?
— Clara?
— Sim, Clara! Quem é?
— Eu não conheço ninguém com o nome de Clara.
— Alaíde mandou mensagem para a Maura dizendo que você fala muito nessa Clara.
— Ela não tem ocupação?
— Sei lá!
— Isso é calúnia, sabia? Ou difamação?
— Calúnia? Quem é Clara?
— Eu não conheço nenhuma Clara, eu já falei.
— Ela falou que o dia inteiro você chama essa “Clara”. Pergunta onde ela está, chama de meu amor, meu benzinho.
— Mulher maluca.
“Nhau, nhau…”
— Você ouviu isso?
— Isso o quê? Não ouvi nada.
“Nhau, nhau…”
— De novo!
— Chiii! Quieta, Kyara. — Disse o namorado, quase sussurrando.
— Olha, até meu nome você está trocando, me chamando de Clara? — Janaína, levanta-se da mesa.
— Como é que é? Eu não falei Clara, eu disse “Kyara”!
— Ah… então o nome dela é Kyara? — Disse a namorada, empurrando a cadeira com raiva.
— Não estou acreditando! Senta, Jana, por favor! — Ele coça a testa.
— Quem não acredita sou eu!
— Nós viemos de longe para nos encontrar e passar uma noite romântica, e você…
— Eu, o quê?
— Ou pior, essa Alaíde estragou tudo!
— Não coloque a Alaíde nessa história!
— Ah… mas ela é a responsável por essa briga idiota num restaurante caro que reservei há seis meses.
— Anda, fala! Quem é Kyara?
— Essa mulher estragou a minha surpresa! Ah… mas ela me paga amanhã! E, além disso, escuta tudo atravessado!
— Não muda de assunto, cara!
“Nhau, nhau…”
— Já vai, Kyara, já vai… Fala Beto, olhando para debaixo da mesa.
— De novo? Ouviu? Kyara! P’ra mim, chega, Beto! Peça a conta agora! E o que você tanto olha para debaixo dessa mesa? Pensa que não estou vendo?
— Pela última vez, Jana, me deixa explicar?
— OK… é sua última chance!
“Nhau, nhau…”
— Calma! — O namorado pega uma caixa redonda de presente e entrega à namorada.
— Calma? O que é isso? — Ela olha, com estranheza, a caixa colorida.
— Meu bem, é seu presente, o que você queria tanto. — Diz Beto, carinhosamente, e ela abre o presente.
— Meu Deus! — Fala admirada, quase chorando de emoção.
— Não coloque Deus nessa história, Jana! — Diz o rapaz, dando uma leve risada. — Eu te apresento “Kyara”, a gatinha que você tanto me pediu.
— Que vergonha! — Fala Janaína e, em seguida, beija o namorado.
— E a Alaíde achando que era Clara, uma suposta namorada minha… Mulheres!
— E vocês… homens!
— São as nossas imperfeições, meu bem, não é verdade?
— Ela é realmente um “amor”, Beto. Uma fofura!
Janaína acaricia a gatinha branca. Dá-lhe um beijo entre as orelhas, mas olha fixamente o namorado.
— Você me desculpa? Eu pensei que…
— Tudo bem. — Ele interrompe. — Eu jamais iria fazer isso com você, Jana. Eu te amo! — Fala o namorado, desenrolando a pequena coleira de Kyara onde estão escondidas duas alianças:
— Quer se casar comigo?
— Clara! Não! Claro… que sim, Beto! Eu te amo tanto! Abraçados a Kyara, os dois se beijam.
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Juliana Fernandes Gontijo é jornalista por formação e atriz. Uma redatora apaixonada pela escrita criativa, cultura de maneira geral, que ama escrever, contar histórias reais ou fictícias.