Coopetição ou 'se não pode com ele, junte-se a ele'. Por Crislayne Andrade.

Quem não se lembra da “briga de foice” que era o início do relacionamento entre taxistas e motoristas de aplicativo quando a Uber desembarcou no Brasil, com direito a protestos e embates diretos, corpo a corpo?

Pois quem diria que, anos mais tarde, com a consolidação das plataformas de uso compartilhado de veículos, regidas pela economia colaborativa, os amarelinhos (para os cariocas) se renderiam aos encantos da empresa norte-americana?

Desde março deste ano, graças a uma parceria com a Stuo, empresa de tecnologia em gestão de mobilidade, é possível solicitar corridas de táxi também pela plataforma, no Rio de Janeiro, fazendo frente a outras alternativas do setor (como a 99). Outras cidades brasileiras já contam com o serviço, como São Paulo, Salvador, Belo Horizonte e Fortaleza, emulando o que já acontecia em grandes metrópoles, como Nova Iorque, Atenas, Seul, Montreal, Sydney e Madri.

Analisando essa jogada sob a perspectiva do marketing estratégico, podemos ver como a marca trabalhou o que poderia ser uma ameaça no ambiente externo como uma oportunidade, fortalecendo-se no mercado e trazendo o que seria um competidor para dentro de casa. Esse tipo de iniciativa é o que se conhece como “coopetição”, modelo no qual concorrentes colaboram para gerar valor mútuo.

Além de ampliar a capilaridade, com maior oferta de carros, e integrar a categoria de taxistas no modelo de negócio, os usuários também podem se sentir mais seguros do que pegar um veículo na rua, graças aos recursos de compartilhamento de trajeto e verificação de cadastro dos motoristas.

Como usuária, confesso que me sinto muito mais confortável com esta opção. No início do ano, em viagem, tive uma corrida em Miami (EUA) que desafiou todos os meus filtros de segurança e me deixou com a sensação de vulnerabilidade, como mulher estrangeira, exatamente por pegar um cab totalmente no escuro, sem essa sensação de controle sobre placa, identidade, trajeto etc. – uma experiência completamente diferente da que nos acostumados a lidar, ao usar os aplicativos.

Há cerca de cinco anos fiz um curso livre sobre a metodologia de gestão estratégica Balanced Scorecard (BSC), pela Pearson College London, no qual estudamos exatamente o case da Uber, e a percepção era de que, grosso modo, a empresa ainda se equilibrava para gerar resultados financeiros para os acionistas (registrando prejuízo de mais de US$ 6 bilhões no primeiro semestre de 2019), embora as expectativas para o futuro fossem promissoras. Iniciativas como a parceria com táxis mostram como a empresa se mantém viva, buscando soluções de inovação em mobilidade urbana por meio da tecnologia, arejada, com aprendizagem contínua e atenta ao comportamento do consumidor – como deve ser.

Afinal, segundo relatório da Statista Mobility Market Outlook, o mercado global de mobilidade por aplicativo deve movimentar mais de US$ 400 bilhões até 2028, impulsionado pela urbanização, digitalização e mudanças nos hábitos de consumo. No Brasil, a Uber ainda lidera, com cerca de 70% de market share, mas enfrenta concorrência crescente de empresas como 99 e inDriver, o que reforça a necessidade de estratégias de diferenciação e inovação contínua.

Com o perdão do trocadilho, especialmente quando tratamos de negócios em mobilidade, não se pode ficar parado!

Crislayne Andrade é jornalista pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, especialista em Marketing pela Fundação Getulio Vargas, com formação internacional em Gestão de Marketing Estratégico pela Ohio University e em Neuromarketing pelo Instituto Brasileiro de Neuromarketing. Atua como consultora na Flor de Pedra Comunicação e Marketing e como revisora e editora de publicações no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.