NOVA COLUNISTA: Jéssica Michellin - Contar histórias ('storytelling') como estratégia de 'branding' no Turismo.

No contexto atual da era digital, a comunicação é rápida, interativa e imprevisível, exigindo que as empresas vejam o mercado de maneira holística e se adaptem às necessidades de seus consumidores. Neste sentido, as marcas devem utilizar diferentes estratégias de comunicação, principalmente no ambiente digital, para um branding (gerenciamento de uma marca) eficiente.

No caso do segmento de turismo, especialmente nos serviços de hospedagem, sejam grandes redes hoteleiras ou plataformas como Air Bnb, surge a necessidade de uma gestão de marcas eficiente. Justamente por oferecerem um serviço, a qualidade percebida da marca perpassa por dimensões como competência (capacidades e habilidades dos funcionários para a execução dos serviços), confiabilidade (precisão e segurança na execução dos serviços), tangibilidade (aspectos concretos relacionados à prestação de um serviço, no caso dos hotéis, o conforto das suítes é um exemplo), iniciativa pessoal (boa vontade dos funcionários em ajudar) e empatia (cuidado e personalização que a empresa dedica a cada usuário) (PINHO, 1996, p.86).

Neste sentido, as marcas ligadas aos serviços de turismo devem ter uma gestão de branding ainda mais efetiva, com o intuito de criar uma experiência de marca mais assertiva para seus clientes, gerando lucros e aumentando seu valor de mercado. Sendo assim, tornam-se exemplos de como uma gestão de marca efetiva, baseada em estratégias exitosas de comunicação e marketing, podem agregar valor a uma organização.

O branding é formado, basicamente, por algumas características, tais como conhecimento (as pessoas conhecem e entendem os valores e atributos de sua marca?); proteção (como ela se protege e se diferencia das demais pensando no contexto social, cultural, ambiental e jurídico?); comprometimento (a empresa pratica o que diz?); capacidade de adaptação (como ela se transforma ao longo do tempo para atender às necessidades de seus consumidores); autenticidade (quais valores sua marca possui?); relevância (ela transforma sua vida para melhor?); diferenciação (ela se diferencia claramente da concorrência?); presença (ela está nos locais e momentos certos?); entendimento (a mensagem da empresa é clara?); consistência (a marca atende às expectativas do consumidor?).

E uma das maneiras mais eficientes de abordar essas características é por meio do storytelling. O ato de contar histórias, formadas pela combinação de conteúdo, imagens e sons, tem por objetivo transmitir uma narrativa, sempre com o intuito de provocar sensações no espectador.

Trata-se da utilização de elementos das tramas (plots) no desenvolvimento do planejamento e da realização das ações de comunicação, com a determinação clara de papéis e roteiros a serem desenvolvidos pelos personagens. Então, nesse ambiente, as marcas, os produtos, as empresas e os diferentes públicos podem assumir papéis que interagem no objetivo de alcançar uma resolução de conflito ou para chegar ao final de um enredo (MARKUS; CARRILHO, 2014, p.130).

No caso das marcas, a ideia é seduzir o consumidor por meio de narrativas que tragam valores e atitudes positivas, de maneira que torne a mensagem relevante na vida do consumidor. A narrativa deve apresentar o quanto uma marca pode ser relevante, adaptável ao longo do tempo, autêntica, diferente, consistente etc., criando conexão e identificação com o seu espectador e possível consumidor. Ao utilizar o storytelling, a propaganda recorre ao discurso lúdico, uma vez que ‘cria com o público uma relação íntima, em que os valores, os objetivos, as emoções e as expectativas são compartilhadas de forma constante, criando relações de longo prazo, muito além da apresentação de um produto ou motivação para compra’ (MARKUS; CARRILHO, 2014, p. 133).

Na sociedade atual onde as preferências e os grupos são efêmeros, a adesão a causas de marcas e produtos também é. As marcas se utilizam de histórias estrategicamente contadas com o intuito de tornar o consumo de um determinado produto ou serviço algo natural da vida do ser humano. Assim, essas narrativas (histórias) passam a ser adotadas pelos públicos, estabelecendo entre marcas e pessoas uma conexão formada por interações e fidelidade. Além disso, o público passa a se enxergar como parte fundamental da narrativa, recontando a história e reforçando, ainda mais, esta conexão. Desta maneira, os admiradores da marca passam a compartilhar em suas redes, comentar com os amigos e, assim, aumentam a visibilidade de um determinado produto. No fundo, o storytelling quer vender um produto/marca/ideia/serviço, mas de maneira sutil, reforçando as histórias e narrativas que se relacionam com ele. A ideia não é dizer que o produto é bom, mas compartilhar uma história ‘forjadamente verdadeira’ de como uma pessoa se sentiu bem após consumo de um determinado bem.

No turismo, a ferramenta pode ter um impacto positivo e relevante, se analisamos as possibilidades de histórias que um hotel ou destino podem oferecer, criando conexões entre espectadores e marcas. Todo lugar tem uma história a ser explorada, seja a partir da perspectiva do visitante, como também do próprio morador. O compartilhamento de experiências, especialmente por meio das redes sociais, tem sido uma das estratégias mais adotadas por influenciadores digitais do segmento de turismo. Uma das plataformas colaborativas deste segmento, o Air Bnb, ‘um mercado comunitário confiável para pessoas anunciarem, descobrirem e reservarem acomodações únicas ao redor do mundo, seja de um computador, de um celular ou de um tablet‘ tem feito diversas campanhas apresentando a histórias das pessoas que cedem seu espaço para viajantes, sempre reforçando a ideia de que, ao reservar um espaço por meio da plataforma, você estará vivendo como um local vive. Esta é uma das mensagens e um dos atributos intangíveis que mais estimulam turistas e viajantes a reservar um local por meio da plataforma.

Ao se utilizar de storytelling, as marcas passam a convidar o ‘espectador’ a compartilhar sua história em relação ao produto, ou seja, a comunicação deixa de ser unidirecional para ser bidirecional, em que o espectador interfere positivamente (ou negativamente, em alguns casos) em uma narrativa. Neste sentido, o receptor passa a protagonizar uma experiência de marca, contribuindo para a construção do posicionamento de um determinado produto. Tal papel só pode ser concedido ao receptor da mensagem graças às inovações tecnológicas que permitiram a explosão de redes sociais, como Facebook, Instagram e WhatsApp. Por meio destes aplicativos, passamos a viver uma situação única em que qualquer pessoa pode produzir conteúdo e interferir na dinâmica de consumo, formando, assim, a sociedade em redes.

Referências

AIR BNB. Quem somos. Disponível em: <https://www.airbnb.com.br/about/about-us> Acesso em 4 de novembro de 2017.

BAUMAN, Zygmunt. Identidade: entrevista a Benedetto Vecchi. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.

BAUMAN, Zygmunt. Vida líquida. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar Editora, 2008.

CARRILHO, Kleber; MARKUS; Kleber. Narrativas na construção de marcas: storytelling e a comunicação de marketing. Revista Brasileira de Comunicação Organizacional e Relações Públicas Organicom. São Paulo, v.20, 2014.

CASTELLS, Manuel. A era da informação: economia, sociedade e cultura, vol. 3, São Paulo: Paz e terra, 1999.

KOTLER, Philip; KELLER, Kevin Lane. Administração de marketing. Pearson Prentice Hall, 2006.

PINHO, J. B. O poder das marcas. Summus Editorial, 1996.

Jéssica Michellin é especialista em Gestão de Comunicação e Marketing pela Universidade de São Paulo (USP) e em Marketing Intelligence pela Universidade Nova de Lisboa (NOVA-IMS). Com mais de 8 anos de experiência no setor de comunicação e marketing no turismo, atua como Gerente de Marketing Brasil para o Palladium Hotel Group.