Brumadinho, Jendayi Cosméticos e o Marketing de Oportunidade.

Hoje, quinta-feira (31/01), completa uma semana do rompimento da barragem de Brumadinho, na grande Belo Horizonte (MG). Não há palavras para definir a dor das famílias que passam por essa situação e a de todos nós, brasileiros, diante dessa tragédia. Há, sim, uma mistura de sentimentos: comoção, indignação, raiva, impotência, solidariedade, desespero, enfim, tudo junto. No meio daquela lama toda tem filhos, amigos, parentes, conhecidos…tem gente! Seres humanos que achavam que aquele 25 de janeiro era só mais um dia no calendário do ano e saíram para cumprir sua agenda de trabalho ou lazer.

Segundo informações do corpo de bombeiros, até hoje já se contabilizam 110 mortos e 238 desaparecidos. É muita dor! Mas é também muita indignação quando pensamos como algo que poderia ser evitado, acontece. Nos perguntamos a todo instante como uma empresa do porte da Vale não dá garantias de segurança nem mesmo dentro de suas próprias dependências. O que dizer, então, do entorno? E aqui, também, entra o papel do governo e órgãos responsáveis pelo setor que não têm, no mínimo, uma fiscalização rigorosa sobre essas barragens construídas no país. Daí a discussão sobre a proximidade entre barragens e comunidades que vivem nas redondezas. Segundo matéria da Folha online (leia em https://bit.ly/2S0sfmd), técnicos apontam que não há, atualmente, uma distância mínima que deve ser respeitada. Klemens Laschefski, professor do Departamento de Geologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), ao ser entrevistado pela Folha, entre outras declarações, admite não entender ‘como se constroem barragens onde vive gente’. ‘Isso só é comum onde há uma legislação ambiental fraca’, diz.

Dados, sofrimento e dores à parte, eis que no meio disso tudo, surge uma empresa de cosméticos, a Jendayi (confesso que nunca tinha ouvido falar), lançando uma campanha sobre o tema em suas redes sociais. Sob o mote de ‘Brumadinho CLAMA’ e ‘A dor também é nossa’, a empresa fez uma superprodução fotográfica com modelos interpretando vítimas da tragédia. Deu errado, claro! E, apesar dos argumentos em defesa da ‘boa intenção’ da marca, a campanha foi rejeitada pelos internautas, que deixaram mensagens de repúdio nas redes sociais da empresa.

‘O objetivo desta campanha é mostrar que existe uma marca de cosméticos que se preocupa com a beleza… a beleza da vida. Nossos cosméticos embelezam os cabelos, mas nossas atitudes podem deixar um sorriso, um olhar, uma família, um sonho… mais iluminado e bonito. Nossa empresa está nesta luta’, defendeu Jorge Beirigo, fotógrafo e diretor de marketing da empresa.

Vamos combinar! Foi uma péssima hora para divulgação da marca. O Marketing de Oportunidade, ou seja, o uso de um determinado momento, situação ou evento específico para promoção de uma marca, existe e pode, sim, contribuir para dar visibilidade à empresa, mas é bom lembrar que essa visibilidade tanto pode ser boa como pode ser ruim se a abordagem do tema em questão e a estratégia utilizada forem mal executadas. Uma rápida pesquisa na internet pode apresentar cases de sucesso sobre o assunto, mas esse da Jendayi, certamente, entrará para o rol dos desastres (desculpe o trocadilho) em se tratando de marketing.

Faltou sensibilidade? Sim, faltou! Faltou empatia? Sim, faltou muito! E me vem outra pergunta: Naquele momento em que a equipe de estrategistas de marketing, propaganda e publicidade se reuniu para pensar essa campanha e começou a explosão de ideias, ninguém se perguntou ‘Cara, tudo é marketing? Precisamos mesmo usar desse momento para divulgar a nossa empresa e seus benefícios na área da beleza? Isso é marketing de oportunidade ou de oportunismo?’. Talvez, se tivessem feito esses questionamentos, não teriam produzido essa campanha que causou impacto, sim, mas de forma negativa.

Por fim, além da campanha de mau gosto, o comunicado da empresa se desculpando nas redes já começa com uma frase infeliz e que não retrata a realidade: ‘A Jendayi Cosméticos vem por meio desta pedir desculpas pela má repercussão de campanha veiculada por nós’. Ora! A empresa precisava se desculpar era pela campanha inoportuna e desastrada e não pela sua repercussão negativa nas redes. Isso aí foi consequência apenas e tão somente do trabalho ruim que fizeram.

Está na hora de pensar um pouco mais em qualidade da comunicação e menos em marketing desesperado, ganancioso e egoísta.

NOTA DESTE OCI: Excepcionalmente esta coluna foi antecipada em um dia – por conta da pauta urgente.

Ana Cristina Guedes é jornalista, especialista em Comunicação Institucional e Comunicação Política, e Mestre em Comunicação Social pela Universidade de Valladolid, na Espanha.