A reputação na lama e a comunicação em um mundo paralelo da fantasia. Por Andrea Nakane.

No próximo dia 5 de novembro, o crime ambiental gerado pelo rompimento de barragens da extração de minérios administrada pela Samarco, ocorrido nas cercanias de Mariana, em Minas Gerais, completará seis anos.

É uma data de fomento de esforços para uma maior pressão nos poderes executivo, legislativo e judiciário que ainda não demonstraram um posicionamento realmente mais enérgico e, porque não dizer, comprometido com as comunidades atingidas direta e indiretamente pelos atos que chocaram o mundo.

Os responsáveis por tal negligência foram a empresa Samarco, já citada, controlada pela Vale, em sociedade com a anglo-australiana BHP Billiton. A barragem que se rompeu provocou uma enxurrada de lama tóxica que dizimou por completo o distrito de Bento Rodrigues e deixou 19 mortos, além de devastar a bacia hidrográfica do Rio Doce, matar a vida aquática e acabar com o turismo e a subsistência de milhares de pessoas.

É importante não esquecer que o tsunami de resíduos que arrasou comunidades e percorreu mais de 600 quilômetros até o Atlântico, modificou as vidas de centenas de milhares de pessoas e prejudicou gravemente o ecossistema da região. Sem falar que, em 2022, os processos judiciais continuam travados, sem encaminhamentos produtivos e decisivos. Em qualquer nação séria, agentes públicos responsáveis e executivos das empresas envolvidas estariam presos. No mínimo, a companhia já deveria ter indenizado, por meio de multas bilionárias, as vítimas – o que ainda não ocorreu.

Em 2019, outro crime, que desbancaria a tragédia da Samarco, como o maior acidente ambiental do país, deixando um rastro de 270 óbitos e inúmeras cenas de extermínio, marcou as mesmas terras das Gerais, dessa vez a região de Brumadinho. A destruição também atingiu em cheio o rio Paraopeba. Muitos alegam que esse acidente foi fruto da impunidade ocorrida em Mariana e que há outros que podem ocorrer a qualquer momento.

A problemática maior está justamente no empobrecimento do solo, já desgastado com o extrativismo compulsório, que o deixa pobre em nutrientes e acaba aumentando os resíduos gerados com o processo.

É preciso, mais que nunca, pensar em inovações e assumir um diálogo total com a sociedade na busca de manter uma real transparência na conduta desse negócio, que já foi compreendido como necessário e relevante para todos, mas que necessita alterar seu formato exploratório que domina as minas no Brasil há mais de 300 anos.

A ganância, infelizmente, impera e as questões humanitárias e ambientais ficam como coadjuvantes.

É preciso chamar o segmento, chamado da indústria das indústrias, para realmente agir em prol de um propósito coletivo, tendo sua engrenagem econômica garantida, mas sem esquecer de suas responsabilidades sócios-ambientais, muito além de recolhimento de tributos e geração de empregos.

Hoje em dia, projetos de inovação e tecnologia em ascensão podem e devem fazer com que o trabalho das mineradoras se transforme.

Os acidentes que ocorreram nos últimos anos deixaram visíveis que há problemas sérios e que mesmo com as auditorias externas contratadas, a participação de fiscalização do Estado é mínima, quando não inexistente, o que provoca uma imagem de completa falta de credibilidade e até mesmo vergonha de suas atuações.

A comunicação na ótica de uma crise dessa envergadura não pode ser apenas vivenciada no momento da questão… Não é por meio de vídeos bem roteirizados, que em muitos casos queiram até mesmo transformar os causadores da tragédia como próprias vítimas, que a comunicação deve se pautar.

É preciso investir em diálogos constantes, com escuta assertiva e a conclamação de todos os cidadãos para não só debater, mas sobretudo acompanhar as ações orquestradas, se é que estão sendo assim conduzidas para mitigar ou findar com tamanhas barbaridades.

O que acaba transparecendo é que a indústria, com seu poder incontestável, abastece uma sistemática corrente de corrupção junto ao Primeiro Setor ou até mesmo de menosprezo com relação aos apelos de profissionais da área que alegam que é possível a exploração do minério com baixo impacto ambiental, mas isso requer tecnologia e custos.

E o custo disso para essas gigantes do minério, pelo jeito, é considerado supérfluo, o que nos remete a interpretar que a vida humana e de todos os outros seres vivos não ocupe sua linha de prioridades número 1.

Pelo menos essa é a mensagem que está sendo passada.

Em época de ESG, esse tipo de comportamento diz muito sobre o setor que, com a reputação na lama, precisa urgentemente agir e realmente se alinhar sob uma comunicação eficiente e eficaz, para não se tornar um rejeito deplorável na memória da população.

Por enquanto a ficção do espetacular poeta Carlos Drummond de Andrade, que nasceu em Itabira, Minas Gerais (onde começou a Vale do Rio Doce, que ironicamente antes de acabar com o rio tirou o “Rio Doce” do nome) ganha projeção elevada: O Rio? É Doce; A Vale? Amarga.

É, assim como suas coirmãs que, juntas, precisam despertar que o tempo urge e elas precisam agir e comunicar com muita transparência a adaptação ao século XXI.

Andrea Nakane é bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Relações Públicas. Possui especialização em Marketing (ESPM-Rio), em Educação do Ensino Superior (Universidade Anhembi-Morumbi), em Administração e Organização de Eventos (Senac-SP), e Planejamento, Implementação e Gestão da Educação a Distância (UFF). É mestre Hospitalidade pela Universidade Anhembi-Morumbi e doutora em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo, com tese focada no ambiente dos eventos de entretenimento ao vivo, construção e gestão de marcas. Registro profissional 3260 / Conrerp2 – São Paulo e Paraná.