A educação em tempos de pandemia. Por Fernanda Campos.

As portas fechadas das escolas em tempos de pandemia não significou a parada na educação. A necessidade de ficar confinados em casa promoveu a procura de soluções rápidas para dar continuidade ao período letivo em todos os níveis de ensino da educação infantil à pós graduação. De modo emergencial, foi preciso reorganizar e adaptar novos espaços para a continuação das aulas.

O que acompanhamos, de modo geral em vários países, foi a utilização de tecnologias digitais como um meio das aulas continuarem, no que vem sendo chamado de ensino remoto.

Mesmo sem saber muito bem como e o que fazer, pois não houve tempo para planejamento e organização. Foi tudo feito de forma emergencial. Acompanhamos uma adaptação do ensino presencial para o espaço virtual do dia pra noite. É preciso sublinhar que várias  instituições optaram por não continuarem o período letivo por não haver condições de acesso a internet  para todos os seus alunos.

E, por mais que se soubesse da existência de práticas e metodologias para a educação a distância, não foi isto que se adotou nas escolas. A pandemia descortinou algo que há muito se sabia: falta de infraestrutura das escolas, formação de professores para o uso de tecnologias insuficiente, metodologias tradicionais e pouca valorização do papel do professor.

Para compreender o que vem sendo praticado hoje nas escolas, precisamos entender alguns processos, em especial sobre a diferença entre o que é a educação a distância e o que vem sendo chamado de ensino remoto.

A Educação a Distância de forma breve

A compreensão de educação a distância (EaD) que temos hoje é bastante distinta do que se praticava há anos atrás, em que imagino a maioria deve lembrar: Instituto Universal Brasileiro ou do Telecurso 2000. A EaD constituiu como uma modalidade de educação histórica, iniciada com o envio de materiais por correspondência, também se fez pelo rádio, pela TV, por discos rígidos e nos últimas décadas, no por meio da rede mundial de computadores.

O uso das tecnologias digitais, nas últimas décadas, permitiu formas mais interativas de ensinar e de comunicar. Com tempos e espaços flexíveis, com a comunicação síncrona e assíncrona, com a constituição de relações mais aproximadas entre professores, com o uso de múltiplas ferramentas para criação de atividades, com uma diversidade de metodologias específicas, com a constituição de um desenho próprio. Para fazer um projeto de EaD é preciso de planejamento, e com um com prazo alargado para organização, é necessário uma equipe multidisciplinar – múltiplos profissionais envolvidos, faz parte a criação de materiais específicos. Ou seja, funciona de uma maneira própria. Normalmente, o público dos cursos de EaD é o adulto.

Ensino remoto

Agora, vejamos, no momento em que as escolas foram fechadas, em virtude da crise sanitária do COVID-19, buscou-se continuar com as aulas, em uma tentativa de reduzir prejuízos no cumprimento do calendário escolar. Mas detalhe: do mesmo modo como se constituía no presencial e para todos os níveis de ensino: da educação infantil a pós-graduação. Temos vivido uma experiência completamente nova.

O ensino remoto emergencial vem se constituindo por: horário marcado, carga horária a cumprir, busca de soluções rápidas, normas muito semelhantes ao presencial. É preciso estar presente, ou seja, é preciso estar em sincronia e inibe a flexibilidade essencial da EaD.

O que vemos foi a transferências de métodos do ensino físico para o ensino remoto.

Neste modelo, temos ações bem mais simples, pois verifica-se ausência ou baixo tempo para planejamento, em alguns casos, ausência de apoio da coordenação e professores sem formação buscando soluções individuais.

A única coisa em comum entre a EaD e o ensino remoto é uso de tecnologias para mediar os processos de ensino e aprendizagem.

Agora vejamos de forma esquematizada a diferença entre elas:

Isto significa, que os professores nos últimos meses trabalharam muito e tiveram que lidar com uma situação completamente nova e desafiadora. Se viram com uma necessidade de se instruir de forma breve sobre as possibilidades de diálogo com os alunos, envio de atividades e avaliação. Têm sido utilizados e-mails, mensagens por whatsapp, plataformas de aprendizagem, videoaulas, museus virtuais, ferramentas diversas de partilhas.

Por outro lado, também vimos o resgate de algumas práticas históricas como a volta das teleaulas, transmitidas pela televisão, e até via rádio, para tentar atender aqueles que não tem acesso à rede mundial de computadores.

Destacamos a seguir alguns problemas enfrentados durante a pandemia:

  • excesso de atividades ou pouca atividades enviadas;
  • muito tempo de aulas online, conferindo com a grade curricular presencial;
  • exigência de acompanhamento mais direto dos pais, que muitas vezes, também estavam em tele trabalho sobrecarregando as várias tarefas e a dificuldade pedagógica dos pais ensinarem os filhos os conteúdos;
  • segurança de dados, em especial, tratando dos menores de idade;
  • pais que não querem pagar as mensalidades em escolas privadas por não terem optado por um ensino remoto;
  • descontentamento dos alunos, sentem que não aprendem;
  • aumento da desigualdade na educação, entre os que possuem acesso e aos que não possuem;
  • infraestrutura para atender a todos os alunos;
  • formação de professores;
  • e muitos outros….

O que aprendemos, sobre a educação e o uso das tecnologias:

  • Ninguém estava preparado. Mesmo com projetos ou usos de tecnologias digitais em sala de aula, pensar a escola fora da sala ainda era algo ainda para ‘perspectivas futuristas’;
  • Ensino remoto não é educação a distância;
  • É preciso projetos governamentais para os investimentos de infraestrutura nas escolas e para que todos os alunos tenham acesso a computadores e a internet;
  • É preciso buscar experiências históricas da EaD para conseguir chegar a todos, para isto tele aulas e aulas via rádio;
  • A valorização e a formação dos professores são cada vez mais necessárias;
  • A introdução das tecnologias não é a melhor resposta para a ressignificação dos processos educativos, é preciso repensar práticas e o papel do professor.

A questão que sempre fica é: como fica a educação pós-pandemia?

Em Portugal, o Ministro da Educação, Tiago Brandão, anunciou que no próximo ano letivo as escolas deverão incorporar práticas mistas de ensino e aprendizagem (blended learning). Ou seja, incorporar práticas online e presenciais para adaptar as novas situações de organização escolar. Também apontou a necessidade da entrega de um Projeto de Tecnologias, que aguardamos. Mas ainda existem muitas incertezas.

No entanto, sabemos que muito precisa ser feito. A pandemia deu um choque, mas não sabemos se em dose suficiente para promover mudanças significativas e necessárias na educação.

E mais, sabemos que não é só uma questão de infraestrutura ou que novos modos serão suficientes para responder às necessidades da educação. É preciso repensar as políticas, é preciso  apoiar o desenvolvimento profissional dos professores, incentivar o desenvolvimento de competências digitais e pedagógicas, verificar a qualidade e eficiências das práticas em ‘blended learning’, repensar a prática pedagógica, incentivar competências de auto regulação aos alunos e dos professores. São muitos desafios. A pandemia só jogou mais luz naquilo que há muito precisava ser visto e revisto.

Fernanda Campos – Graduada em História, mestre e doutora em Educação e tem dedicado seus estudos e experiências à educação a distância, educação e tecnologias, metodologias inovadoras e Comunicação e Educação. Reside em Lisboa, Portugal. Linkedin: https://www.linkedin.com/in/fernandaaccampos/