Mulheres guerreiras do século XXI. Por Laize Barros.

O Dia Internacional da Mulher, comemorado em 08 de março, existe para homenagear a nós, mulheres do presente e lembrar de mulheres do passado que abriram caminho para muitas conquistas, a admissão em universidades, o direito ao voto feminino, a assunção de cargos de liderança política e direção em empresas, de sermos donas de nossos corpos, do poder de escolher ser mãe ou não. Sabemos que nossa liberdade está longe de ser completa e nossa igualdade passa por mudanças sociais, culturais e políticas.

As histórias de mulheres – do passado e do presente – são repletas de ensinamentos, de superações e de lutas.

Sabemos que mulheres já se vestiram de homem para lutar por seus países, como Joana D’Arc e Anita Garibaldi, ou se disfarçaram de escritores para defender o Direito à Educação, como a paquistanesa Malala Yousafza, prêmio Nobel da Paz em 2017, ou aquelas que perseguiram seus sonhos pagando um alto preço por isso como a nossa Chiquinha Gonzaga, a primeira pianista a tocar choro e autora de inúmeras marchinhas de Carnaval.

Escreveu a jornalista e escritora espanhola Rose Montero em seu livro “Nós, mulheres”, “… sempre houve mulheres capazes de superar as mais penosas circunstâncias; mulheres criadoras, guerreiras, aventureiras, políticas, cientistas que tiveram a habilidade e a coragem de escapar, não se sabe como, de destinos tão cruéis como uma tumba”.

Inventar um sistema de escrita, o nushu, para não ser descoberta e contar com um espaço de fraternidade e desabafo com outras mulheres faz parte da história de mulheres da província chinesa de Hunan, onde mulheres eram mantidas analfabetas e apartadas da vida social. Contam as mais velhas da província que o nushu foi uma invenção da concubina de um imperador chinês para criar um grupo de mulheres como rede de proteção.

Estes males – o sexismo, o preconceito e as barreiras às escolhas genuínas das mulheres para decidirem sobre seu futuro – ainda nos rondam em pleno século XXI.

“O que você vai ser quando crescer?”.

Acho que a maioria de nós ouviu esta pergunta quando criança e nem todas fomos estimuladas a seguir seus desejos, em especial as meninas.

A discriminação de mulheres exercendo determinadas profissões ou cargos pode ser considerada sexismo, um preconceito baseado no gênero ou sexo de uma pessoa e que afeta mais mulheres e meninas. A falta de modelos a seguir, o desestímulo de pais, amigos e familiares, preconceitos em relação a determinadas carreiras consideradas menos lucrativas são fatores que pesam mais nas escolhas de carreiras de meninas.

Devemos a este tipo de preconceito, não apenas o impedimento de escolhas profissionais mais genuínas por parte das jovens, mas também do crescimento na carreira de profissionais do sexo feminino. No Brasil, mulheres estudam mais e têm renda 41,5% menor que os homens, relata pesquisa da ONU.

Devemos à luta de muitas mulheres nossa admissão em universidades, o voto feminino conquistado no século XX, a abertura para um novo tempo de sororidade e uma tendência à equidade de gênero, ainda em construção.

Sororidade é “relação de irmandade, união, afeto ou amizade entre mulheres, assemelhando-se àquela estabelecida entre irmãs”, segundo o dicionário online de português.

Em março de 2021, a Revista Forbes Brasil, uma curadoria de tendências do mundo da cultura e do campo social, listou as 20 mulheres de sucesso no Brasil e estampou em sua capa Djamila Ribeiro, a filósofa brasileira que em 2020 teve um de seus livros como o mais vendido pela Amazon.

A lista demonstra ser a equidade de gênero uma tendência sem volta no mercado de trabalho porque a diversidade trouxe benefícios significativos ao ambiente corporativo como eficiência, inovação e harmonia.

E as mulheres do século XXI, como lidam com suas escolhas em pontos de inflexão da vida e da carreira, aqueles momentos de nossas vidas que determinam qual caminho seguiremos?

Quatro mulheres inspiradoras!

Eu entrevistei 4 mulheres inspiradoras, representantes de nosso tempo, com idades diversas e especialistas em diferentes áreas do conhecimento; escritora, podcaster, professora, educadora, facilitadora, produtora de conteúdo digital.

Generosamente, contaram-me alguns momentos especiais de suas vidas e carreiras e fizeram sugestões aos novatos e novatas sobre o que fazer mais e o que fazer menos para a superação dos desafios profissionais de nosso tempo tão complexo!

Cris Guerra, escritora e produtora de conteúdo digital, ficou viúva aos 36 anos grávida de seu filho Francisco, hoje com 14 anos, “eu passei a compartilhar um pouco de meus sentimentos e do meu dia a dia por meio de um blog com a publicação de cartas para meu filho, chamado ‘Para Francisco’. Isso me tirou da publicidade, onde trabalhei por 20 anos como redatora, acabei transformando a minha vida em profissão. Eu enfrentei o meu luto e a minha maternidade solo compartilhando e descobrindo muitas coisas. Sou uma pessoa que tem a sorte de poder viver trabalhando com comportamento e usando a minha própria vida como material de trabalho”. O blog ‘Para Francisco’ foi um sucesso e virou livro, hoje aos 50, Cris Guerra é colunista de rádio e revista, podcaster do ’50 crises’. No seu podcast e nas demais mídias, Cris Guerra nos recebe com seu delicioso sotaque mineiro e bom humor para abordar temas como etarismo, moda, escrita e “sobre dar a volta por cima, fazer das adversidades oportunidades”.

Uma experiência similar de “virada” me contou Cecília Seabra: “em 2018 minha vida mudou. Após saber que seria demitida por corte de custos, tomei uma decisão que considero corajosa: não mais pautar minha vida pelo trabalho, mas o oposto”. Cecília Seabra atua como mentora e consultora de comunicação para pessoas e empresas e é professora nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda. Criou o site ‘da Ceci’ e o podcast ‘A comunicação nossa de cada dia’.

Tania Sanches, especialista em Psicologia Positiva, PNL e CNV, podcaster do ‘Chá positivo’, me contou que seu ponto de inflexão foi em 2009 quando “tive um burnout – estado de estresse crônico que me levou a exaustão física e emocional, pedi demissão de um emprego que me pagava muito. Hoje, vivo um dia de cada vez e todo o meu conhecimento obtido, transformei em cursos online e treinamento para empresas para melhorarem seu estado emocional e nível de felicidade”.

Cris Guerra, Cecília Seabra e Tania Sanches, por motivos diferentes, criaram o trabalho de suas vidas e alinharam vida e carreira. No mundo em constante transformação nem sempre encontraremos o trabalho que desejamos nos anúncios das redes ou que tais, teremos que criar o trabalho de nossas vidas.

Criar novos trabalhos e exercer várias carreiras ao longo da vida, transitar de uma carreira para outra e mesmo exercer várias atividades ao longo da vida são características da vida moderna permitidas pela longevidade conquistada pelos avanços da ciência e das transformações digitais.

Ganha destaque o conceito de life long learning, em português, aprendizagem contínua ou educação para toda vida. Aprender para sempre é o que nos obriga em um mundo em constante transformação, mundo VUCA – volátil, incerto, complexo e ambíguo. E a pandemia apressou muitas das projeções como a do trabalho remoto e a gestão com base na confiança.

Simone André, especialista em Educação e consultora independente, pode ser considerada uma lifelong learner, ela me relatou “hoje estou em uma terceira carreira, agora como consultora independente, contribuindo com diferentes organizações e construindo uma visão mais ampla e colaborativa”.

Provocadas por mim para dar sugestões sobre o que fazer mais e o que fazer menos na superação dos inerentes desafios profissionais que enfrentamos na atualidade, nossas entrevistadas destacaram várias soft skills, as habilidades socioemocionais do futuro.

Num mundo cada vez mais dinâmico cuja única certeza é a impermanência, para crescer na carreira é necessário desenvolver competências como empatia, resiliência, autoconhecimento, colaboração e sobretudo ser capaz de navegar nas incertezas.

Cris Guerra ressaltou a empatia como ponto de destaque para que novatos e novatas fiquem atentos, aconselha a escritora “trazer nossa verdade incluindo a nossa vulnerabilidade para o nosso trabalho é o que faz as pessoas se conectaram com a gente, perceber que somos reais, normais e que temos os nossos problemas, os nossos desafios, isso é muito poderoso. Eu traria este grande ensinamento”.

Cecília Seabra e Tania Sanches apontam o malefício da comparação e dos julgamentos indicando a necessidade de autoconhecimento e da autenticidade. Ser “congruente com o que pensa, sente e fala” para o desenvolvimento profissional, destaca Tania Sanches e ampliar “o conhecimento para desenvolver visão estratégica, senso crítico, capacidade argumentativa e de dialogar”, enfatizou Cecília Seabra.
A especialista em Educação, afinada com nosso tempo, nos lembra que há “Menos certezas. Cada vez menos certezas e cada vez mais abertura para descobrir novas maneiras de entender o que é a escola”.

Last but not least, pedi para Cris, Cecília, Simone e Tania espiarem o futuro, voltar e nos contar o que viram lá.

Nossas “futuristas” enxergam um mundo melhor logo ali na frente e trabalham nessa construção que ainda é um caminho.

Fiel à sua especialidade a Psicologia Positiva que foca as potencialidades do ser humano, Tania Sanches viu no futuro “pessoas mais conscientes de sua saúde mental, preocupadas em desenvolver habilidades que realmente importam para se ter uma vida com paz de espírito”, um mundo “do amor compartilhado, da compaixão e da empatia pela dor do outro”.

“Cautelosamente otimista”, Cecília Seabra “gostaria de ver no futuro uma sociedade que reaprendeu a dialogar, mais colaborativa e menos competitiva, disposta a diminuir desigualdades e que tem na educação e no conhecimento seu ativo de maior valor”.

Simone André viu no futuro “a Educação pautando a economia. Um projeto de nação e produtividade à serviço das pessoas. E um projeto de educação à serviço da superação das desigualdades que destroem esse país. Vi a Educação e as escolas ajudando o planeta a enfrentar as crises climáticas, a pobreza, as pandemias. Vi crianças, adolescentes e jovens – sem distinção – pensando, sentindo, decidindo e agindo sobre o mundo onde habitam”.

Em sintonia, Cris Guerra avistou “um mundo mais colaborativo, mais verdadeiro e coletivo com pessoas preocupadas com o que é essencial. Um mundo equilibrado ecologicamente porque seremos sabedores de que somos parte do todo, enfim um mundo mais humano”.

E quem pode dizer para onde vai a estrada?

ELAS seguiram o que apontam os futuristas de profissão, como Rosa Alegria que diz “somos nós que salvaremos o futuro e não os robôs” e para tal precisamos usar nosso potencial feminino de transformação, de criar, de nutrir para nos situarmos como um partícipe do Planeta.

Contar essas quatro histórias foi reavivar a memória das mulheres que nos antecederam cujas lutas abriram caminho para nosso presente de sororidade e, ao mesmo tempo, frisar que as mulheres de hoje com sua garra preparam o terreno fértil para um futuro mais colaborativo e humanizado que vislumbramos.

Faltaram muitas, mas cada mulher citada aqui representa todas as mulheres do mundo.

Eu sou Laize de Barros, ajudo pessoas a alinhar Vida e Carreira com mentorias e cursos. Psicóloga e Mestre em Psicologia e Educação (USP), colunista da Comunidade Marketing da Gentileza e do Observatório da Comunicação Institucional. Escritora das minhas histórias e das que espio nas janelas da vida. @laizedebarros IN IG