Critérios 'ESG': modismo ou um movimento legítimo, real e lucrativo?

Por José Maria Bernardelli Junior, Marcelo Suster e Viviani Bleyer Remor, colaboradores Ambiental Mercantil.

Nos últimos dois anos, a mídia tem sido bombardeada pela “nova onda” de matérias trazendo para o campo dos holofotes fundos “diferenciados” de ativos de organizações que embutiram – em suas estratégias e práticas -, preocupações com seu desempenho ambiental, cuidado com as pessoas de um modelo de governança corporativa pautado na ética, plena aderência legal e transparência nas suas operações. Tais fundos, os fundos ESG, têm em sua sigla a representação das palavras, em inglês, Environment, Social e Governance.

Na origem de sua fundamentação, além de inúmeras contribuições, temos a inolvidável colaboração do sociólogo inglês John Elkington com o conceito de Triple Bottom Line. Se por um lado ótimas matérias tragam a lume os conceitos ESG e instituições como o Merrill Lynch & Co. apontam um panorama atual animador e cenários animadores para as “empresas ESG”, por outro lado temos aqueles que rebatem duramente o “brilho” dessa “onda” como Heiko Hosomi Spitzeck (Diretor do Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral) argumentando brilhantemente que o discurso ESG incorpora tão somente uma preocupação dos investidores (que não querem ter dores de cabeça) porém sem uma narrativa que consiga acalmar e convencer a sociedade. De quebra, na contramão da euforia um estudo realizado pelo Bank of America, destaca que nos últimos cinco anos, os índices ESG não apresentaram desempenho acima do registrado em relação aos demais índices de ações.

Isto posto, como interpretar os fatos de maneira inequívoca e resolver esse imbróglio? Questões inerentes ao contexto atual:

Antes de mais nada, é preciso concordar que, mesmo em pleno século XXI, vivemos fenômenos únicos e também que um sem número de práticas do passado não são mais minimamente aceitáveis. Dentre tais fenômenos, merecem destaque a perda de vidas, ecossistemas e seus serviços, e também as mudanças climáticas já em curso (não obstante os negacionistas), que deverão impactar severamente os negócios em larga escala, além do significativo comprometimento dos recursos naturais e serviços ecossistêmicos já presentes e para as próximas décadas – a julgar o passo em que estamos.

De igual maneira, no âmbito das relações humanas, não é aceitável o estabelecimento e manutenção de relações servis tantas vezes alimentadas pelo excesso de força de trabalho versus a oferta exígua de postos de trabalho, descortinando a miríade de histórias nas quais seres humanos se vêem feridos em sua dignidade.

Aceitar esses fatos que condensamos é o ponto de partida para sermos guindados a uma nova instância de discussão sobre ESG, tanto quanto negá-los materializa um convite para um urgente retorno aos bancos escolares a fim de açambarcar conhecimentos fundamentais para viver no contexto socioambiental dos dias atuais.

Ao falarmos do “E” de meio ambiente, isto implica entendermos claramente que questões tais como o uso de recursos naturais, emissões de gases efeito estufa, eficiência energética, gestão de resíduos, gestão de passivos e pleno compliance ambiental são tópicos mínimos que devem estar presentes na agenda daquelas organizações que operam – principalmente aquelas com significativas externalidades negativas e que desejem apostar na própria existência e rentabilidade de longo prazo. Sem a gestão ambiental efetiva não haverá amanhã.

Quando tratamos da parte social, o “S”, nos defrontamos com o insofismável convite à humanização do modelo investindo no amplo diálogo entre as partes, no respeito e na valorização da pessoa humana, suas potencialidades, perspectivas e contribuições para a organização. O ser humano é a razão de tudo!

Com efeito, a governança corporativa representada pelo “G” implica num “modelo de existir” da organização, a qual traduz a resposta para uma sociedade em permanente transformação exigindo qualidade, responsabilidade, ética, transparência e compromisso. Cada vez menos empresas, não importando o porte ou a sua localização, conseguirão vender qualquer coisa, de qualquer jeito, para qualquer um.

Transição para um novo modelo

Findas essas breves considerações, é forçoso considerar que não obstante quaisquer siglas ou eventuais “novas ondas”, as organizações de todos os tamanhos, segmentos, nacionalidades ou modelos de gestão, devem – sim – adotar práticas que compreendam a gestão dos seus impactos negativos sobre o meio ambiente, a gestão de relacionamentos profícuos com seus stakeholders e a busca incessante (melhoria contínua) pela qualidade, atuando com responsabilidade e ética.

Quando tratamos de critérios ESG, falamos de investimento em organizações no longo prazo.

Isso traz um grau de incerteza maior mas, por outro lado, tais investimentos além de representar 100% de retorno em face dos impactos concretos (mensuráveis e relatáveis), conduz a uma redução sensível dos riscos operacionais. Em resumo, mesmo que a valorização dos ativos não supere a de outros fundos não ESG, no mínimo resultará numa contribuição à permanência da organização operando com riscos reduzidos e com a sua respeitabilidade em alta ante uma sociedade cada vez mais consciente e exigente.

A transição do velho modelo para o novo revela-se como um caminho prenhe de descaminhos, equívocos e armadilhas (às vezes conceituais). Migrar do business as usual para esse modelo ESG demanda reposicionamento estratégico, planejamento apurado, assessoramento consistente e uma gestão de mudança capitaneada por pessoas com olhos no futuro. Será vital identificar os indicadores relevantes, estabelecer correlações, definir metas, monitorar e promover ajustes; atividades que se enroscam quando evoluem do campo da teoria para a prática.

Muitas empresas têm manifestado seu interesse em revolucionar seu modelo de negócios, carecendo de auxílio nessa rota de transição e foi com esse objetivo que desenvolvemos o curso critérios ESG na gestão empresarial; conceitos e aplicações, de maneira a discutir os mais variados aspectos de ESG, trazendo informações e orientações que permeiam as melhores estratégias de transformação do ambiente corporativo.

Imagem: Ambiental Mercantil.

José Maria Bernardelli Junior é consultor técnico, palestrante e professor universitário. Atua em gestão ambiental, em gestão por processos e operações turísticas (hotelaria, aviação, eventos e tours). É mestre em Administração/Gestão Ambiental e Sustentabilidade (Uninove), com formação em Gestão Ambiental (FMU), MBA em Gestão Estratégica em Meio Ambiente (Mauá), e também, designer de sustentabilidade urbana (Gaia Foundation/UMAPAZ). É professor convidado nos programas de pós-graduação da Universidade Nove de Julho / UNINOVE (Cursos: Engenharia Ambiental, Engenharia de Avaliações e Perícias, e Engenharia de Segurança do Trabalho).

Marcelo Suster é mestre em Tecnologia Ambiental/IPT, MBA em Gestão Empresarial/FGV, MBA em Marketing/ESPM, especialização em Tecnologia e Ciência de Materiais Vítreos/Friederich Schiller Universität/Alemanha, engenheiro de materiais/UFSCar, técnico em materiais cerâmicos/SENAI, experiência profissional em comercialização de resíduos sólidos como produtos na Alcoa Alumínio, reciclagem de embalagens Longa Vida na EET/Piracicaba e diretor de tecnologia de tratamento de resíduos sólidos na TSL Engenharia Ambiental. Atual diretor de negócios da Ecouniverso. Experiência em palestras, cursos e treinamentos Escolas/Universidades: IPT – Faculdade Oswaldo Cruz, Universidade Federal de Sergipe, USP/São Carlos, UFSCar, FATECs e ETECs, bem como nas seguintes entidades/associações: Instituto Paula Souza, ABIPLA (Associação Brasileira das Industrias de Produtos de Limpeza e Afins), ABRE (Associação Brasileira de Embalagens), ABC (Associação Brasileira de Cerâmica), ABAL (Associação Brasileira de Alumínio e Instituto UMAPAZ (prefeitura da cidade de São Paulo).

Viviani Bleyer Remor possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Catarina (1988), especialização em Políticas Públicas pela Universidade do estado de Santa Catarina e Mastère Specialisé en Management de LInnovation / Bresil / Ecole Nationale Supériuere des Mines Saint / Etienne, França. Implantou e coordenou a área e os programas socioambientais do Grupo Celesc. Palestrante no VIII Cedelef – Convencion de Distribuidores de Energia, no Perú, na Companhia de Melhoramentos da Capital (COMCAP), nos seminários de melhores práticas em responsabilidade social da Associação Brasileira de Distribuidoras de Energia Elétrica. É militante de Direitos Humanos e de Inclusão Social. Consultora independente em sustentabilidade.