A volta dos que não foram...

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Com a morte de Nelson Mandela, além de toda a mobilização mundial, estamos assistindo a um triste espetáculo sob o silêncio da mídia e de todo o resto: Fernando Collor de Mello, presidente que sofreu impeachment, sair, com viagem paga pelo nosso bolso, com status presidencial, igual a FHC – gostemos dele ou não -, Lula e Dilma.

Sarney foi um presidente biônico, eleito vice num pleito indireto e que tomou posse sem que Tancredo Neves o tivesse feito. Um arreglo brasileiro dos bons. Ou dos piores, ainda não sabemos, mas foi a saída que houve para que os milicos não continuassem: colocar seu office boy como candidato da oposição e, por azar do país, tê-lo sentado no Planalto durante 5 anos.

No entanto, é um acinte à memória e à militância política brasileira a presença de Collor como um ex-presidente comum, como se não tivesse sido deposto, como se as massas não tivessem ido às ruas para isso.

Perguntada sobre o que achava dessa escolha, Maria José da Silva respondeu curta e grossa: “O que esse homem está fazendo lá? Nos representando? Que cretinice!”

Não vi um coleguinha ou uma ONG de direitos humanos se manifestar. O fato foi aceito pelo silêncio coletivo e, embora o silêncio seja um campo minado, esse mutismo leva mais jeito de uma aquiescência boquiaberta, como se todos estivessem anestesiados e não se dessem conta, ou não possam acreditar, que chegamos a este ponto do descaso, do cinismo e do desrespeito.

Outra coisa que passou praticamente batido foi a seguinte afirmação, semana passada, do senador neoevangélico, Magno Malta (PR/ES): “Temos votos para matar o PL 122, que criminaliza a homofobia”. Naquele dia, mais uma vez, a votação do PL 122 foi adiada – e há anos é tirada de pauta pela bancada evangélica, a qual insiste em dizer que “criminalizar a homofobia fere o ‘direito de expressão’ dos evangélicos”. Os mesmos que costumam demonizar os homossexuais.

E, assim, continuamos num país em que o Estado, pela Constituição, é laico, mas refém de bancadas neopentecostais, que usam e abusam da sua força – crescente – a cada eleição.

Acesse o link:

Frente Evangélica pretende aprovar outra lei que substitui o PLC 122

O projeto do senador Paulo Paim não criminaliza o discurso religioso contra homossexuais, pelo contrário, ele o defende Frente Evangélica pretende aprovar outra lei que substitui o PLC 122 A Frente Parlamentar Evangélica anunciou essa semana que vai apoiar o projeto de lei 6418/2005, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS) que criminaliza a homofobia, mas sem interferir no discurso religioso que a condena

 

Somos o país que mais espanca mulheres e mata homossexuais. Temos um presidente deposto num grupo de ex-presidentes, representando o Brasil, em cerimônia internacional.

Que eu me lembre, Lula não convidou Collor para o enterro de João Paulo II, quando também convidou um grupo de ex-presidentes.

É como se nada tivesse acontecido, como se os caras-pintadas e o povo nas ruas durante meses para derrubar Collor e seu esquema de corrupção.

Terá o apoio do PT, se candidato ao governo de Alagoas. Foi chamado de “nosso senador”e de “companheiro”por Lula. Vive como se nada houvesse rolado por aqui.

Passaram uma esponja no nosso passado recente, e é como se aquele pesadelo vivido nunca tivesse acontecido.”

Mesmo que ele tenha sido absolvido como chefe de um dos maiores esquemas de desvio de dinheiro, não foi absolvido pela massa que foi às ruas e o depôs.

Tudo isso, sob o beneplácito da mídia. Não ninguém protestando.

Como diz Chico Buarque””chamem o ladrão!

Sobre Marcia de Almeida

Jornalista, escritora, roteirista, videomaker e militante da cidadania. Carioca de Botafogo, e botafoguense de coração, escreveu 4 livros de ficção e foi por muito tempo correspondente internacional, quando cobriu a guerra da Bósnia. Integra a Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ e, assinou mensalmente, por dois anos, no Caderno RAZÃO SOCIAL d’O Globo, a coluna Razão & Cidadania, abrangendo temas relacionados a minorias: LGBTs, pessoas com deficiência, ciganos, racismo, vítimas de intolerância, preconceito etc.